A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, solicitou nesta terça-feira (25) ao ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), a suspensão do inquérito que investiga o presidente Michel Temer (MDB) e os ministros Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (Minas e Energia).
No relatório final do inquérito sobre repasses de R$ 10 milhões da Odebrecht para integrantes do MDB, a Polícia Federal concluiu pela existência de indícios de que o presidente cometeu crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. O documento também indica a prática dos mesmos crimes pelos ministros.
O caso está relacionado com o jantar no Palácio do Jaburu, em 2014, e que foi detalhado nos acordos de delação de executivos da Odebrecht. Então vice-presidente, Temer teria participado do encontro em que os valores foram solicitados.
O principal argumento utilizado por Raquel Dodge para embasar o pedido ao ministro Edson Fachin, relator do inquérito no Supremo, foi a imunidade constitucional temporária à persecução penal que o presidente possui. A procuradora-geral lembrou em sua manifestação que a Constituição Federal proíbe que o presidente seja denunciado por atos anteriores ao mandato.
“A Constituição veda, portanto, a possibilidade de responsabilizar o Presidente da República e de promover ação penal por atos anteriores ao mandato e estranho ao exercício de suas funções, enquanto este durar”, escreveu Raquel Dodge, escolhida para o cargo de procuradora-geral da República por Michel Temer, em junho de 2017.
“Assim, deve-se aguardar o término do mandato presidencial para a formação da opinio delicti em relação aos fatos relacionados ao Senhor Presidente da República Michel Miguel Elias Temer Lulia.”
Em seu parecer, Raquel Dodge narra que, embora Eliseu Padilha e Moreira Franco não sejam parlamentares, são alcançados pela nova interpretação do foro privilegiado. Segundo ela, os dois desvincularam-se de seus cargos anteriores em 2015 e apenas retornaram ao cargo de ministros em 2016, em pastas diferentes daquelas relativas aos fatos investigados.
“Portanto, os eventos delituosos apurados neste inquérito ocorreram em momento que precede ao atual cargo ocupado e não há relação de causalidade entre os crimes investigados e o exercício do cargo atual. Diante disso, os fatos objeto deste Inquérito nº 4462 devem ser remetidos ao Juízo de 1ª instância com competência para processar e julgar os fatos narrados”, escreveu.
O ministro Edson Fachin, do STF, havia dado um prazo de 15 dias para que a procuradora-geral da República decidir se apresentaria ou não denúncia contra o presidente e seus ministros. Temer foi denunciado duas vezes pelo ex-procurador-geral Rodrigo Janot – uma por corrupção e outra por obstrução da Justiça e organização criminosa -, mas os casos foram barrados pela Câmara em 2017.
Relatório da PF. No caso do presidente, a PF mapeou a entrega de R$ 1,4 milhão para João Baptista Lima Filho, o coronel Lima, amigo do emedebista. Para sustentar a tese, a PF ouviu o doleiro Alvaro Novis, responsável pelas entregas, e anexou uma conversa em que o próprio Lima aparece em ligação para a empresa de Novis em dias das entrega dos valores.
“Pelo teor da conversa, resta inconteste que, ao ser informado sobre a chegada da encomenda, João Baptista Lima Filho informou que estava distante do local, solicitando que o horário fosse remarcado para as 15h, informação que acabou se refletindo nos diálogos mantidos via Skype”, diz trecho do relatório.
A ligação para a empresa do doleiro foi às 10h25 de 19 de março de 2014. Às 11h35, Lima ligou para um celular em nome de Temer e, às 11h37, o amigo de Temer recebeu outra ligação da empresa do doleiro responsável pelas entregas. Logo após esta conversa, às 11h51, Lima voltou a ligar para Temer com quem falou cerca de 5 minutos.
Defesas. Em nota, Brian Alves Prado, advogado de Michel Temer, informou que a manifestação da procuradora-geral da República “é natural, já que a Constituição Federal proíbe que o Presidente da República seja responsabilizado por fatos anteriores ao cargo”.
A defesa de Eliseu Padilha discordou da manifestação de Raquel Dodge de declinar competência por entender que os fatos narrados apontam eventual pedido de caixa 2 de campanha, “matéria essa afeita à Justiça Eleitoral, conforme pacífica posição do próprio STF no assunto. Tal ponto, entretanto, será debatido apenas nos autos”.
Para o advogado Antônio Sérgio de Moraes Pitombo, defensor de Moreira Franco, a “manifestação não traz fundamento que convença”. “Não consigo compreender qual ginástica hermenêutica autorizaria, agora, alterar a competência sem a ocorrência de fato novo”, avaliou Pitombo.