Economista responsável pelo programa de governo do presidenciável Ciro Gomes (PDT), Mauro Benevides propõe a criação de uma estrutura semelhante ao Comitê de Política Monetária (Copom) para definir os rumos do câmbio do Brasil. “Tem de ter uma institucionalização para o gerenciamento do câmbio. Podemos definir um comitê para fazer isso”, disse ele, durante a sexta edição da série Estadão/FGV/Ibre Os Economistas das Eleições, com os responsáveis pelos planos econômicos de governo dos principais presidenciáveis, realizada nesta terça-feira, 18, no auditório da Fundação Getúlio Vargas (FGV), em São Paulo.
Embora a criação de um comitê para decidir os rumos do câmbio possa soar como uma intervenção nos rumos da moeda – que têm tido livre flutuação, com intervenções pontuais do Banco Central (BC) em momentos de crise -, Benevides afirmou que essa instituição no estilo Copom daria transparência às decisões. “O Copom tem uma atuação clara e definida, pautada por critérios técnicos. É isso que queremos levar ao câmbio”, disse, lembrando que hoje decisões sobre operações de bilhões de dólares são tomadas pela diretoria do BC.
Na sabatina, Benevides ainda tocou em propostas como o programa de renegociação de dívidas proposto pelo candidato – chamado “Nome Limpo” e apelidado de “SPCiro” -, da necessidade de mudança do foco da cobrança de tributos no Brasil e da pressa em aproveitar a boa vontade do Congresso no primeiro ano de seu eventual mandato como presidente para aprovar o ajuste fiscal. A seguir, os principais trechos da sabatina:
Qual é a proposta de Ciro para a política cambial?
Tem de ter institucionalização para gerenciamento do câmbio. Podemos definir um comitê para fazer isso. O Copom tem uma atuação bem clara e definida, pautada por critérios técnicos. É isso que queremos levar ao câmbio.
Isso soa como intervenção.
Intervenção na minha concepção é eu chegar e definir. Não faz sentido um cara (da diretoria do BC), sozinho, definir o rumo do câmbio com bilhões em swaps cambiais (ferramenta usada para combater a volatilidade do real).
O programa de Ciro propõe a renegociação de dívidas de inadimplentes no Serasa e no SPC.
O desemprego é uma questão sistêmica – se tem mais desemprego, há mais inadimplência. (A proposta é para atender principalmente a trabalhadores que ganham) até dois salários mínimos, pagando 400% de juros no cartão de crédito. Não podemos permitir que 63 milhões de brasileiros fiquem à margem do mercado de consumo se quisermos levar a retomada adiante. Pelo lado da demanda, o consumo corresponde a mais de 60% (do PIB brasileiro). Não é fazer caridade, é medida de curtíssimo prazo para reativar este motor do crescimento.
Como vai funcionar essa renegociação?
Vamos segmentar por tipo de crédito, por empresa, e pegar as pessoas que estão na mesma situação. É um pool de devedores. A ideia é sair (de uma dívida média) de R$ 4,2 mil para algo em torno de R$ 1,1 mil para cada endividado. Ele vai diminuir a dívida, reduzir juros e vai pagar em 36 meses. Não é fazer caridade, é medida de curtíssimo prazo para reativar este motor do crescimento. Serasa e SPC estão interessadas nesse programa e querem colocar isso para frente. A gente vai dar dinheiro aos bancos com esse programa.
E como os bancos vão lucrar com o ‘SPCiro’?
Ganhando 12% ao ano (que é o juro proposto para as renegociações).
Quais serão as prioridades de Ciro num eventual mandato?
Nunca o Congresso Nacional se furtou a aprovar as medidas enviadas no primeiro ano de governo, nem com o Collor, que confiscou a poupança de todo mundo. Por isso, estamos antecipando a discussão das medidas (para o período da campanha). Em vez de começar a discutir em janeiro ou fevereiro, estamos expondo (as propostas) agora. O atual governo quis empurrar mudança goela abaixo, mas não foi aceito. Um governo legitimamente eleito conseguirá. Primeiro, vem a reforma tributária, com a criação do IVA (Imposto sobre Valor Adicionado). Temos como prioridades a reforma tributária e da Previdência.
E a criação de um imposto sobre movimentações financeiras, nos moldes da CPMF, está nos planos?
Não seria como a CPMF. Na CPMF, o cara que passou um chequezinho lá de R$ 30, ele pagou imposto. E a essência desse programa é a classe média, a empresa média, não pagar nada. A ideia é excluir movimentações de R$ 5 mil para baixo – assim, você retiraria 86% da população brasileira. Eu não estou preocupado com o cheque de R$ 5 mil. Estou preocupado com as movimentações que eu conheço, dentro do sistema financeiro, de R$ 10 milhões, de R$ 100 milhões, de R$ 1 bilhão. Por isso, que o nome é CGM, Contribuição sobre Grandes Movimentações. Mas o comitê de governo não incorporou a proposta no plano de governo.
Qual é a sua política de combustíveis?
A questão da Petrobrás (foi de extremos nos últimos anos). Primeiro, veio a Dilma e tabelou o preço. Aí chega o outro presidente da Petrobrás e põe o preço lá em cima, comparar com o preço internacional (e com variação diária). O trigo é commodity, a soja também, e não tem alterarem preço todos os dias. Então, aguarda-se um período e depois se faz a equiparação. Senão, o (caminhoneiro) sai do Rio Grande do Sul para Pernambuco com o gasto do diesel previsto para R$ 1,4 mil. No outro dia, o preço já foi para R$ 1,5 mil. No outro, aumentou de novo.
E existe um ‘meio do caminho’ a ser adotado?
Temos de deixar a Petrobrás encontrar ponto de equilíbrio. Empresa pública tem de ser lucrativa. Até porque a Petrobrás tem altos e importantes investimentos em pesquisa e tecnologia.
Subsídio ao diesel continuará?
Aliás, o preço do diesel continuou aumentando (mesmo com a política de subsídio). Não posso ser o Posto Ipiranga, não posso saber de A a Z. Essa questão do subsídio tem de ser vista, ninguém pode falar de subsídio sem ver a variação de preços de mercado.
Existem empresas públicas que podem ser privatizadas?
Sim, tem várias. Não temos nenhuma idiossincrasia em relação à privatização. Não nos interessa ter empresa pública deficitária. Se a empresa não conseguir ser eficiente, obviamente tirando as quatro ou cinco empresas que para nós são emblemáticas para a governança, não temos restrições.
Qual é a proposta para o setor industrial?
Temos visto a queda da participação da indústria brasileira no PIB. A Coreia do Sul escolheu seus setores e foi para a universidade, colocando a indústria dentro do processo de pesquisa. A China primeiro tentou imitar, fazendo versões “made in China”. Depois investiu em pesquisa e tecnologia (para melhorar a qualidade dos produtos). E nós temos de fazer pesquisa, fazer financiamento de médio e longo prazos, para ela ser competitiva e ir para o mundo. Temos de escolher setores com vantagem comparativa.