O governo federal alterou quatro decretos de 2019 que regulam a aquisição de armamento e munição por agentes de segurança e grupos de Colecionadores, Atiradores e Caçadores (CACs). As alterações flexibilizam os limites e facilitam a compra e estoque de armas e munição.
As mudanças foram divulgadas na noite de anteontem, em edição extra do Diário Oficial da União. Segundo o governo, “a medida desburocratiza procedimentos, aumenta clareza sobre regulamentação, reduz discricionariedade de autoridades e dá garantia de contraditório e ampla defesa”.
Na manhã deste sábado, Bolsonaro, que passa o carnaval com a família em São Francisco do Sul (SC), citou o referendo de 2005 ao divulgar, no Twitter, a publicação dos decretos. “Em 2005, via referendo, o povo decidiu pelo direito às armas e pela legítima defesa”, afirmou. A consulta popular levou à derrubada de um artigo do Estatuto do Desarmamento que proibia o comércio de armas no País.
Facilitar o acesso às armas e munições é uma bandeira de Bolsonaro desde a época em que ele era deputado. Em 2019, já presidente, ele tentou flexibilizar o porte e a posse de armamento por decreto, mas foi derrotado no Congresso e anulou as normas, enviando um projeto de lei com a medida.
Em janeiro deste ano, Bolsonaro afirmou a apoiadores, na porta do Palácio do Alvorada, que preparava decretos para facilitar o acesso a armas de fogo a CACs. Na ocasião, disse que o crescimento recorde na venda de armamentos deveria ser mais robusta. Segundo a Polícia Federal, 179.771 novas armas foram registradas no País no ano passado, aumento de 91% com relação a 2019.
Parlamentares de oposição e entidades da sociedade civil criticaram o conteúdo dos decretos e o momento escolhido para a publicação – durante o carnaval -, e apontaram “risco à democracia”. O Instituto Sou da Paz, organização não governamental que atua há 20 anos pela redução da violência no Brasil, expressou “indignação”, em nota. “O governo federal expressa seu desprezo pela ciência e sua falta de aptidão em dar respostas qualificadas aos maiores desafios do Brasil”, diz o texto. “A única resposta que o presidente conhece é liberar armas.”
De acordo com o Sou da Paz, o governo Bolsonaro já publicou mais de 30 atos normativos que levaram ao aumento recorde de armas em circulação no ano passado. “Dados preliminares de 2020 já indicam que houve um aumento nos homicídios mesmo em ano de intenso isolamento social. Este governo parece ter conseguido reverter a pequena queda que tivemos a partir de 2018 e conquistada a muito trabalho”.
O deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) afirmou que Bolsonaro “abriu a porteira” para o armamentismo para “armar as milícias” do presidente. “Quando ele diz que teremos problema maior que o dos EUA nas eleições, é disso que está falando. Não vê quem não quer.”
Marcelo Freixo (PSOL-RJ) disse que Bolsonaro “está armando seus apoiadores para ameaçar as instituições”. “O golpe está em curso”, escreveu em sua conta no Twitter.
Alessandro Molon (PSB-RJ) questionou a falta de prioridade do governo, ao tratar de armamentismo em meio à pandemia. “É lamentável ver que o governo não tem o mesmo empenho para garantir vacina, que já está acabando no Brasil”.
Entenda as mudanças
Decreto nº 9.845
– Aumenta de 4 para 6 o número máximo de armas de uso permitido para pessoas com Certificado de Registro de Arma de Fogo.
Decreto nº 9.846
– Permite substituir o laudo de capacidade técnica – exigido para colecionadores, atiradores e caçadores (CACs) – por um “atestado de habitualidade” emitido por clubes ou entidades de tiro.
– Permite que atiradores e caçadores registrados comprem até 60 e 30 armas, respectivamente, sem necessidade de autorização expressa do Exército.
– Eleva de 1 mil para 2 mil as recargas de cartucho de calibre restrito que podem ser adquiridas por “desportistas” por ano.
Decreto nº 9.847
– Define parâmetros para a análise do pedido de concessão de porte de armas, cabendo à autoridade pública levar em consideração as circunstâncias do caso, sobretudo aquelas que demonstrem risco à vida ou integridade física do requerente.
Decreto nº 10.030
– Dispensa a necessidade de registro junto ao Exército dos comerciantes de armas de pressão, como as de chumbinho.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.