Após requisição da ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), o governo federal enviou esclarecimentos sobre os quatro decretos editados no mês passado com novas flexibilizações para o porte de armas. Os documentos foram elaborados pela Advocacia Geral da União (AGU), que defende judicialmente os interesses do Planalto, e pela Secretaria-Geral da Presidência da República.
A ministra havia dado cinco dias para que o governo se manifestasse em ações apresentadas por quatro partidos de oposição: PSB, PT, PSOL e Rede Sustentabilidade. As siglas afirmam que os dispositivos são inconstitucionais e representam “retrocesso” em direitos fundamentais, na medida em que facilitam de forma “desmedida” o acesso a armas e munições pelos cidadãos comuns.
Argumentam ainda que, embora pretendam disciplinar o Estatuto do Desarmamento, os decretos ferem suas diretrizes e violam o princípio da separação dos Poderes e o regime democrático, uma vez que o Planalto teria assumido a função do Legislativo ao decidir sobre política pública envolvendo porte e posse de armas de fogo.
Em 56 páginas, o governo rebate os pontos levantados pela oposição e defende a permanência dos decretos. De acordo com o Planalto, as mudanças foram pensadas para “desburocratizar procedimentos” e evitar “entraves desnecessários” à prática do tiro desportivo. “Para se conseguir comprar uma arma de fogo é necessário ‘investir tempo e dinheiro’, sendo que levam meses até se conseguir todos registros e autorizações necessários”, escreveu a Secretaria-Geral da Presidência.
A pasta ainda argumenta que, ao sair vencedor das últimas eleições, o presidente Jair Bolsonaro ganhou “legitimidade popular” para “concretizar, nos limites da lei, promessas eleitorais”. “Durante o pleito eleitoral houve intensos debates envolvendo a questão e, ao final, sagrou-se vencedor o posicionamento político encampado pelo Presidente eleito”, afirma.
O governo também tenta inverter a acusação de violação ao princípio da separação dos Poderes. Na avaliação do Planalto, os partidos é que tentam se “imiscuir indevidamente” na matéria ao acionar o Supremo Tribunal Federal para derrubar os decretos editados pelo presidente dentro de sua competência administrativa. “Aí sim estaria configurada a substituição do Executivo pelo Judiciário tanto na análise de questões técnicas, próprias da Administração, bem como no tocante à valoração intrínseca na definição da política pública, com notória ofensa à separação e harmonia entre os Poderes da República”, argumenta a AGU.
Acusado pelos partidos de violar o poder/dever de garantir a Segurança Pública dos cidadãos, o Planalto diz ainda que “a insuficiência do aparelho estatal para blindar o cidadão, por 24 horas, em todo o território nacional”, justifica mecanismos de legítima defesa.
No documento, também foram apresentadas justificativas para itens de ordem técnica flexibilizados pelos decretos, como a permissão para escolas de tiro oferecerem cursos a pessoas que não tenham autorização para posse ou porte de arma de fogo, mas estejam interessadas na obtenção do comprovante de capacidade técnica ou no certificado de registro de caçador, atirador ou colecionador.
“Percebe-se que para a aquisição de arma de fogo pelo cidadão é exigido o exame prático em estande de tiro. Assim, a questão que releva é a seguinte: Como é possível alguém fazer um teste ou uma prova sem praticar ao menos uma vez? Seria o mesmo que ter que fazer teste de direção para tirar carteira de motorista sem jamais guiar um automóvel”, justificou o governo.
Veja algumas mudanças estabelecidas pelos decretos:
Decreto nº 10.627
– Exclusão de uma série de itens da lista de Produtos Controlados pelo Exército (PCE).
– Permissão para a prática de tiro recreativo de natureza não esportiva, com arma do clube ou do instrutor.
Decreto nº 10.628
– Aumento do número máximo de armas de uso permitido para pessoas com Certificado de Registro de Arma de Fogo de quatro para seis unidades.
Decreto nº 10.629
– Possibilidade de substituir o laudo de capacidade técnica – exigido pela legislação para colecionadores, atiradores e caçadores (CACs) – por um “atestado de habitualidade” emitido por clubes ou entidades de tiro.
– Autorização para CACs comprovarem aptidão psicológica com laudo fornecido por qualquer psicólogo com registro ativo em Conselho Regional de Psicologia, sem exigência de credenciamento pela Polícia Federal.