Um juiz de Goiás decidiu usar de uma forma inusitada para condenar a Enel no estado a pagar uma indenização de R$ 20 mil a um proprietário rural que ficou 10 dias sem energia elétrica. O magistrado, que atua no Juizado Especial Cível de Fazenda Nova, utilizou um trecho da música ‘Admirável Gado Novo’, do famoso cantor e compositor Zé Ramalho, em sua decisão.
Na sentença, o juiz Eduardo Perez Oliveira argumenta que o produtor rural habita uma pequena urbe no interior goiano, cuja economia é essencialmente rural. “Não há indústrias, o comércio é tímido. Os empregos, são raros, daí porque a maioria vive ou do município, ou da terra, ou de ajuda estatal ou um misto de tudo isso”. Ao ficar tanto tempo sem energia elétrica devido à falha na prestação de serviço da Enel, o produtor rural acabou tendo grandes prejuízos com sua produção.
Oliveira enfatizou que “as agruras de quem vive no campo são conhecidas e até mesmo inspiraram conhecidos talentos”. Neste ponto da decisão, o juiz cita a famosa canção ‘Admirável Gado Novo’, de Zé Ramalho, e diz que a música é emblemática quando diz: “Ôoo… Hei boi / Vocês que fazem parte dessa massa / Que passa nos projetos do futuro / É duro tanto ter que caminhar / E dar muito mais do que receber […] Êh, ô, ô, vida de gado / Povo marcado Êh, povo feliz! […]”. Leia a decisão na íntegra aqui.
O magistrado cita ainda Morte e Vida Severina, de João Cabral de Melo Neto, da saga do nordestino retirante, e declara que a pobreza do nordeste também é “descrita pelas mãos do talentoso Ariano Suassuna, notadamente em seu Auto da Compadecida”. E lembra do romance Vidas Secas, de Graciliano Ramos, acerca da igual carestia do nordestino.
Em caso que juiz de Goiás utilizou Zé Ramalho em decisão contra a Enel, produtor rural teve grandes prejuízos pela falta de energia
Ao entrar com a ação na Justiça, o produtor rural contou que possui uma fazenda e que ficou 10 dias sem energia elétrica, o que fez com que perdesse aproximadamente 20 quilos de carne, porco e o leite produzido nos dias. Ele revelou ter ligado 19 vezes para a empresa para restabelecimento de sua energia, conforme protocolos.
A empresa, qualificando-se como Celg e não Enel, alegou que não houve falha de serviço, e que interrupções esporádicas são vistas pela Agência Nacional de Energia Elétrica como prováveis e aceitáveis. Alegou ausência de culpa e a impossibilidade de demonstrar que não ocorreram as quedas de energia.
O juiz disse que é verdade que problemas na rede acontecem, mas com resolução em poucas horas, jamais alongando-se. “O descaso é absoluto e o sofrimento da parte autora, por óbvio, presumível”, finalizou.
A reportagem do Dia Online entrou em contato com a Enel Goiás, que informou que ainda não foi intimada sobre a decisão judicial.