O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria nesta quinta-feira, 22, para impedir a expulsão de estrangeiro com filho brasileiro, uma vez comprovado que a criança está sob a guarda do estrangeiro e dele depende economicamente. O entendimento foi firmado na análise de um recurso da União contra decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que proibiu que o governo brasileiro expulsasse do território nacional o tanzaniano Edd Abadallah Mohamed, que cumpriu pena no País por uso de documento falso.
Depois de sete ministros terem votado contra a expulsão de estrangeiro com filho no Brasil, o julgamento foi interrompido pelo pedido de vista (mais tempo para análise) do ministro Gilmar Mendes. Não há previsão de quando a discussão do caso será retomada pelo plenário da Corte.
Um ministro do STF ouvido reservadamente pela reportagem acredita que o julgamento de Mohamed não atinge a situação do ex-ativista italiano Cesare Battisti. Isso porque expulsão (como no caso do tanzaniano) e extradição (caso de Battisti) tratam de duas coisas diferentes. A expulsão de Mohamed envolve estrangeiro que cometeu crime no Brasil e que o então ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, decretou a expulsão em portaria assinada em 2006.
Já a extradição de Battisti diz respeito a um pedido do governo italiano para que ele seja enviado àquele país para cumprir a pena de prisão perpétua pela participação em atentado que resultou na morte de quatro pessoas nos anos 1970 no exterior.
“Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. São coisas distintas e portanto não há nenhuma relação deste caso com qualquer outro caso de extradição. São regras e fundamentos distintos”, disse o vice-procurador-geral da República, Luciano Mariz Maia, à imprensa, após a sessão plenária desta quinta-feira.
Em setembro de 2017, no entanto, a defesa de Battisti entrou com um habeas corpus no STF alertando que ele poderá ser “extraditado, deportado ou expulso do País a qualquer momento”. Uma fonte próxima ao caso de Battisti acredita que o entendimento do STF no caso do tanzaniano pode beneficiar o italiano indiretamente.
Impedimento
A lei 6.815, de 1980 (Estatuto do Estrangeiro), editada durante a ditadura militar, fixava que não constitui impedimento à expulsão do estrangeiro o reconhecimento de filho brasileiro que tenha nascido depois da prática do crime. Ou seja, para a legislação da época a impossibilidade de expulsão só deveria existir quando o filho tivesse nascido antes do fato que motivou a expulsão do estrangeiro.
“O preceito da Lei nº 6.815/1980 afronta o princípio da isonomia, ao estabelecer tratamento discriminatório entre filhos havidos antes e após o fato ensejador da expulsão. Há justificativa constitucionalmente adequada para tal distinção? A resposta é negativa”, disse o relator do caso, ministro Marco Aurélio Mello.
“Os prejuízos associados à expulsão de genitor independem da data do nascimento ou da adoção, muito menos do marco aleatório representado pela prática da conduta motivadora da expulsão. Se o interesse da criança deve ser priorizado, é de menor importância o momento da adoção ou concepção”, completou Marco Aurélio.
Para a ministra Rosa Weber, o foco deve ser a proteção à criança. “Em absoluto a data da concepção (da criança) tendo como referência a data do delito motivador da dispensa guarda qualquer relevância”, disse Rosa.
Além de Marco Aurélio Mello e Rosa Weber, seguiram o mesmo entendimento os ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Cármen Lúcia e Ricardo Lewandowski.