O Supremo Tribunal Federal (STF) deu início nesta quinta-feira, 6, ao julgamento de um recurso extraordinário que discute se o ensino domiciliar pode ser considerado meio lícito de cumprimento do dever de prover a educação a crianças e adolescentes. O ministro Luís Roberto Barroso, relator do caso, votou para permitir o ensino domiciliar. Após seu voto, o julgamento foi suspenso e será retomado na próxima quarta-feira, 13, com o voto dos demais ministros.
Os pais de uma menina ingressaram no Supremo com um recurso contra decisão da Secretaria de Educação do Município de Canela (RS), que negou pedido para que ela fosse educada em casa. Para eles, restringir a educação ao ensino convencional é ignorar as mais diferentes formas de aprendizado, além de uma afronta a garantias constitucionais.
O homeschooling, como é conhecido o ensino domiciliar, é a prática pela qual os pais assumem a responsabilidade pela escolarização formal de seus filhos, deixando de delegá-la às instituições formais de ensino. As aulas podem ser ministradas pelos próprios pais, responsáveis ou por professores particulares contratados.
Barroso, em seu voto, destacou que a escolarização formal em instituição convencional não é o único padrão pedagógico autorizado pela Constituição Federal, que, de acordo com ele, não exclui outros mecanismos a serem utilizados pelos pais. O ministro frisou também que ela não pode ser confundida com a não escolarização da criança. “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar o direito à educação.” Para Barroso, no entanto, os pais têm o direito de escolher o tipo de educação que avaliarem ser melhor para seus filhos.
Ao votar pela permissão ao direito do ensino doméstico, Barroso propôs algumas regras de regulamentação da matéria. Os pais deverão notificar as secretarias Municipais de Educação sobre a opção pelo ensino domiciliar. As crianças deverão ser submetidas a avaliações periódicas e os dados podem ser compartilhados com outras autoridades para facilitar o monitoramento do desenvolvimento acadêmico do estudante.
Se comprovada a deficiência na formação acadêmica, os pais serão notificados e, caso não haja melhoria no rendimento, os órgãos públicos competentes poderão determinar a matrícula nos estabelecimentos regulares.
“Com essas regras, acho que se conciliam os diferentes interesses em jogo. Dos pais, de escolher o método educacional de seus filhos. E do Estado, por seus órgãos, de verificar se o ensino domiciliar está efetivamente permitindo o pleno desenvolvimento daquela criança ou daquele adolescente”, concluiu Barroso.
Ensino convencional
Contrárias ao ensino doméstico, a Procuradoria-Geral da República (PGR) e a Advocacia-Geral da União (AGU) defenderam, por meio de seus representantes, o aprendizado tradicional, em salas de aula. O vice-procurador-geral da República, Luciano Maia, afirmou que o ensino doméstico não é uma modernidade, mas “uma volta ao passado, ao que se aplicava no início do século quando ainda era difícil ao Estado se organizar e identificar que era um dever dar educação para todos”.
Para a ministra Grace Mendonça, da AGU, por mais que o ambiente familiar seja profícuo e responsável, nada substitui a experiência vivenciada nos corredores das escolas, nos trabalhos de grupo e nas atividades envolvidas nas quadras de esporte. “A missão dada pelo legislador ao Estado é assegurar o ensino obrigatório e gratuito. Não se conferiu aos pais a faculdade de levarem ou não os filhos à escola.”