Raquel Rodrigues Mendes, de 44 anos, teve de se adaptar ao encolhimento do salário nos últimos meses. Servidora da Prefeitura de Goiânia, Raquel mudou-se para um cômodo do Jardim Europa pelo qual paga R$250 no aluguel e não recebe mais o neto aos finais de semana.
“Falta dinheiro até para comer”, diz, numa tarde de maio. As dificuldades financeiras vieram assim que o Instituto Municipal de Assistência Social (Imas) começou a descontar dois partos cesáreos, que teriam sido feitos no mesmo dia pela filha dela.
Mas o neto de Raquel, atualmente com 2 anos, nasceu em 8 de agosto de 2015 no Hospital Garavelo, pelo Sistema Único de Saúde (SUS). A servidora trabalha em uma escola municipal como auxiliar-administrativo e o salário, que já era pouco, sofre com descontos que chegam a R$700 por mês.
A vida de Raquel, com transtorno bipolar, depressão e síndrome do pânico, foi toda voltada para a filha Tayane da Silva Mendes. Sem saber o que fazer para sustentá-la, estudou para o concurso municipal e foi aprovada. “Fiquei muito feliz. Eu poderia dar alguma coisa para a minha filha”, lembra.
Aos 17 anos, a filha engravidou. Raquel aproveitou que a menina era dependente dela no Imas e fez o acompanhamento da gravidez pelo plano. “Decidimos fazer todo o pré-natal pelo Imas, mas no dia do parto, a gente conseguiu vaga no Garavelo, em Aparecida de Goiânia. E lá foi feita a cesariana da minha filha”, conta.
Quando Tayane completou a maioridade, Raquel decidiu tirá-la do plano para evitar os descontos. “Então o Imas começou a descontar tudo o que havia sido feito pelo plano nos últimos 12 meses – que seriam apenas as consultas. Levei um susto quando vi que descontavam dois partos”.
Dedo no nariz
A servidora procurou o Imas desde que os descontos começaram em novembro de 2017. Seriam 15 parcelas de R$74,27 que acabariam em fevereiro de 2019. “Quando cheguei lá, o Sebastião [Peixoto, presidente do Imas] colocou o dedo no meu nariz”, denuncia a mulher.
“Para ele que tem um rendimento bom, não faz falta”, ela diz. Para justificar os descontos, o Imas teria dito que ela assinou documentos. “Ele disse que eu assinei, mas não assinei.”
O advogado da servidora, Erick Araújo Miranda, afirma que o parto ocorreu no Hospital Garavelo e não pelo Imas. “O hospital, que funciona em Aparecida, não tem convênio. A minha cliente procurou o Imas, porém, o presidente da instituição, se negou a reconhecer a falha. Eles efetuam o desconto sem ter prestado”, assevera o advogado.
Ele ainda lembra que a sua cliente sofre com transtorno de bipolaridade. “Como não consegue resolver o problema dos descontos, ela tentou suicídio em maio”, relata. Conforme o advogado, o Imas deve devolver em dobro, inclusive por danos morais pelos transtornos.
“O caso pode configurar má-fé. Até o programa um programa de TV foi chamado, mas o presidente conseguiu evitar que a entrevista fosse ao ar. Sebastião Peixoto preferiu manter os descontos”, diz Erick.
Outro caso
O Imas protagonizou um escândalo na semana passada com suspeita de fraudes pelo ex-diretor do órgão, Carlos Henrique Duarte. O Portal Dia Online investigou paralelamente à Controladoria Geral do Município o caso e trouxe entrevistas exclusivas com vítimas das irregularidades. Até um morto teria passado por exame e consulta com geriatra.
Procurado, Sebastião Peixoto, incialmente, informou que caberia à servidora provar que o parto tinha sido feito pelo SUS, mesmo a certidão de nascimento constando nome do hospital que não atende o Imas. “Nós vamos verificar o que aconteceu”, disse, ao telefone, Sebastião Peixoto.
Sem saber que estava sendo filmado, Sebastião Peixoto afirmou que a servidora é “louca”. Ainda segundo o presidente do Imas, a servidora procurou um programa de televisão e até um jornal que, convencidos por ele, não se importaram com as cobranças no contra-cheque dela. Mesmo assim, a reportagem do Portal Dia Online solicitou os documentos que justificassem as cobranças.
Nos dois vídeos a seguir, acompanhe declarações do Peixoto: