A cidade de Goiânia foi construída e projetada sob uma ótica de preservação e valorização do verde muito única. Nesta matéria contamos mais sobre. Assim, neste processo de ocupação, o Setor Sul era o ponto principal para a construção de uma cidade moderna e sustentável.
Inspiradas nas cidade-jardim de Ebenezer Howard, o Setor Sul foi criado para ser uma rede pública conectada de jardins. Dessa forma, as pessoas caminhariam a pé. Assim, as casas ficariam de frente para esses jardins – acessados através dos becos em formatos conhecidos como cul de sac. Dessa forma, teriam passagens apenas para pedestres e nos fundos estariam o acesso para carros, onde as garagens deveriam ser construídas.
No entanto, na apropriação do bairro, iniciado na década de 1940, a lógica executada foi totalmente às avessas. Dessa forma, acarretando no início da desvalorização completa dessas áreas.
Quem já andou no bairro, com certeza, já se perdeu em meio a estes becos e se deparou com locais sujos, insalubres e muitas vezes inseguros. Representando uma imagem completamente diferente do qual eles foram idealizados. Portanto, muitos dos pressupostos que existiam por trás deste traçado, como o fato, por exemplo, das ruas de acesso terem a pavimentação mais permeável e de possível manutenção executável pelos moradores, não foram cumpridos.
Este ponto é bastante interessante. Pois, além de se tratar de uma proposta sustentável, demostra uma preocupação com a criação da afetividade dos moradores para com estes espaços.
Do não reconhecimento do lugar à depreciação e abandono
Ao longo do tempo a inserção de novos edifícios e equipamentos foi modificando mais ainda a estrutura do Setor Sul. Posteriormente, a construção da Avenida Cora Coralina contribui para mudar de forma ainda mais substancial a modificação da estrutura urbana do Setor Sul.
No final da década de 1970, o extinto Banco Nacional da Habitação (BNH), que incentivava a ocupação de áreas urbanas ociosas para otimizar o investimento em infraestrutura urbana, executou o projeto CURA – Comunidade Urbana para Recuperação Acelerada, no Setor Sul.
O projeto focou-se na execução de equipamentos de uso público, que, ignorados no processo de implantação do bairro, só vieram a ser construídos trinta anos depois. Assim, o CURA foi extinto em 1980, sem a conclusão dos trabalhos. Muitos desses equipamentos encontram-se hoje em dia em ruínas.
A nova apropriação pela arte urbana
Recentemente, nos anos 2000, um movimento independente de artistas urbanos começou a usar os becos como local para realizarem seus trabalhos de grafites. Obras que, inclusive, adoramos postar aqui nas nossas redes. Aliás, este local tem a ver com o nascimento do Aproveite a cidade!
O Bosque dos Pássaros é um dos jardins do Setor Sul, antigamente abandonado, e hoje revitalizado por razão dos grafites, de mobilização dos moradores e auxílio da Prefeitura de Goiânia.
O Setor Sul de ontem, de hoje e de amanhã…
O Setor Sul tem grande peso histórico sob a ótica da História do Urbanismo no Brasil. Assim, sob ele, já existiram diversas tentativas de tombamento.
No entanto, a questão é muito mais complexa, envolve a exploração do mercado imobiliário e a proximidade com o centro da cidade, que atrai uma diversidade de serviços e comércios para a região. Além disso, há questões de transporte e mobilidade, como os corredores exclusivos de ônibus, dentre outras questões.
A cidade vai recebendo camadas e camadas de intervenções, que modificam os modos de vida e junto com ele aparecem os problemas urbanos. Assim, soluções efetivas para os problemas urbanos dependem hoje do envolvimento dos atores locais, da sociedade civil e de diversas esferas governamentais, na busca de novas formas de gestão e da capacidade de governança.
Nos países mais desenvolvidos, é comum projetos de Intervenção que modificam a estrutura pré-existente e revitalizam os lugares urbanos, bem como resgatam a história a impulsionam a um crescimento econômico sustentável, como é o caso das Docklands, no Reino Unido.
Nesse processo de apropriação dos lugares abandonados, qual seria a nosso papel enquanto cidadãos? Será que cabe somente ao poder público valorizar o que é nosso?