por Elaine Leme
A arte é, antes de tudo, um reflexo do nosso tempo. Ela traduz angústias, provoca reflexões, projeta futuros e, sobretudo, conecta pessoas. Historicamente, a SP-Arte surgiu com o propósito de promover encontros entre artistas, galeristas, editoras, colecionadores e o público, incentivando o debate, a formação de novos públicos e a profissionalização do setor. Se consolidando como um espaço de visibilidade e inovação, destacando a arte brasileira no cenário internacional.
Quando pensamos no futuro da arte brasileira, é impossível não olhar para a SP-Arte como um dos principais termômetros e catalisadores desse movimento.
A edição deste ano trouxe um leque diverso de obras. Uma das grandes surpresas foi a exibição inédita da obra de Emiliano Di Cavalcanti (1897-1976), tela monumental produzida em 1969, que estava escondida no saguão de um prédio na Avenida Atlântica, no Rio de Janeiro.
Desde de quando chegou no edifício, no mesmo ano de sua produção, a obra nunca saiu do prédio. Adquirida pela Galatea e oferecida por até R$ 8 milhões, a peça foi vendida nos nos primeiros dias da feira. Ver a obra ao vivo é um privilégio, já que ela estabelece um diálogo entre a arte e a literatura, inspirada no livro “Dom Casmurro” de Machado de Assis.

A criatividade se manifestou também nos formatos expostos, apresentando móveis que se fundem com o universo lúdico da costura: sofás, mesas e objetos inspirados em botões e carretéis, mas em dimensões gigantescas. A proposta misturava design, memória afetiva e uma brincadeira com escalas, remetendo ao universo das casas de boneca, em que elementos do cotidiano ganham novas funções e significados.
Essa liberdade criativa que flerta com o imaginário e com as referências pessoais também apareceu no trabalho de Clemilson Santos, artista plástico e escultor do Maranhão.
Representado pela Designs Group na SP-Arte, ele apresentou nesta edição o Bar Nouveau, uma peça exclusiva que combina arte e design. A obra é resultado de uma parceria com a designer Luísa Atabb e traz elementos da fauna e flora brasileira em sua composição.
“Eu nunca estudei arte ou design, mas sempre fui apaixonado por criar”, disse Clemilson. A inspiração para a obra veio de sua paixão por criar peças em movimento. Ele busca capturar a dinâmica da natureza em suas obras, como a onça tomando água, o peixe saltando e o passarinho olhando para baixo.
Luísa Atabb, designer da Designers Group Gallery, também falou sobre a parceria com o escultor. Ela destacou a importância de criar peças exclusivas para eventos de arte e a experiência de trabalhar com um artista plástico.
“A parceria resultou em uma obra única que combina arte e design, apresentando a fauna e a flora brasileiras de forma inovadora e criativa”, disse. Com essa colaboração, a SP-Arte mais uma vez demonstra sua capacidade de reunir talentos e criar experiências artísticas únicas e memoráveis.
Afinal, o que a arte nos move a sentir e pensar?
A arte sempre foi uma lente poderosa para entender o mundo e a nós mesmos. Ela documenta, contesta, ressignifica. Tem papel social, político, econômico e afetivo. Une, aproxima, emociona. Em tempos de urgência climática, polarização política e transformações tecnológicas, ela segue essencial no nosso cotidiano.
Na SP–Arte, essa potência se manifestou de múltiplas formas, performances, instalações, obras digitais, diálogos entre arte, arquitetura e design. A feira também é um convite à experiência, um espaço onde o olhar encontra o inesperado, onde a estética se mistura à ideia e onde o público pode descobrir novas narrativas visuais sobre o Brasil e o mundo.
Com sua biodiversidade única e um território culturalmente vibrante, o Brasil tem tudo para ser um protagonista no debate artístico contemporâneo. A SP–Arte é uma vitrine viva dessa potência.
Confira a seguir 5 galerias do país que proporcionam acesso direto a produções que começam a se afirmar, ou seja, suas apostas para os próximos anos.
A SP-Arte 2025 e as apostas para o futuro da arte brasileira
– Cerrado

A Cerrado Galeria, com sedes em Goiânia (GO) e Brasília (DF), nasceu como um marco da descentralização e fortalecimento do circuito das artes visuais no Brasil. A Cerrado tem como missão dar visibilidade à produção local e apresentar nomes consagrados e emergentes ao público da região. Suas exposições, individuais ou coletivas, convivem com bate-papos, debates e ações educativas que promovem o encontro entre artistas, críticos, curadores e a comunidade.
Em Goiânia, a galeria ocupa um marco da arquitetura modernista, a casa da rua 84, projetada pelo arquiteto David Libeskind (que projetou o Conjunto Nacional, na Avenida Paulista, na cidade de São Paulo), cujos azulejos originais foram preservados como parte da história local. Já em Brasília, prepara-se para inaugurar um novo espaço com mais de 1,6 mil metros quadrados, voltado também a residências artísticas e ações formativas.
Durante a SP–Arte, Júlia Mazzutti, diretora da Cerrado em Goiânia, destacou a jovem artista Alice Lara como uma das apostas promissoras da galeria. A obra “Juju e Rita”, da série As ordens no paraíso, em óleo sobre tela, revela a força simbólica e poética de sua pintura, que vem atraindo olhares atentos no circuito contemporâneo.

Sob a direção de Tatiana Coutinho, a galeria localizada em Vitória (ES) vem ganhando corpo e fôlego desde os tempos da pandemia, quando marcou presença nas edições virtuais da feira e, desde então, não deixou de crescer. Com um olhar que transita entre o novo e o consagrado, a Particular aposta em artistas que trazem para o centro da discussão narrativas plurais, muitas vezes silenciadas pela história oficial.
Entre esses nomes, Luiz Martins sobressai. Nascido no interior de Minas Gerais, em uma comunidade indígena, ele imprime em suas obras uma potência ancestral. Seus trabalhos evocam símbolos e signos rupestres encontrados em sítios arqueológicos como a Pedra do Ingá (PB) e a Serra da Capivara (PI), promovendo uma leitura poética e política da decolonização.
O resultado são composições que despertam curiosidade e reconhecimento no público: formas que parecem familiares, mas carregam significados profundos sobre a origem, o pertencimento e a memória. Para Tatiana, é exatamente essa capacidade de contar histórias esquecidas com sofisticação visual que faz de Luiz uma das grandes apostas da galeria para os próximos anos.
– (clima)

Com duas décadas de trajetória e raízes plantadas entre Brasília (DF), Miami, Rio de Janeiro (RJ) e Porto Alegre (RS), a Galeria Clima levou à SP-Arte um recorte sofisticado de sua curadoria. Fundada por Maurício Lima, a galeria se destaca pelo foco em artistas consagrados como Abraham Palatnik, Miguel Rio Branco, Valtécio Caldas e José Rufino, nomes que marcam presença no estande este ano.
Mesmo priorizando obras já consolidadas, a Clima também aposta em talentos que dialogam com as urgências do presente, como Armarinhos Teixeira, artista que traduz temas ambientais e ecossistemas brasileiros – como o Cerrado e a Caatinga – por meio da bioarte, linguagem em ascensão no circuito contemporâneo.
Outro destaque do time jovem é Maria Porto, artista brasiliense que desafia os limites físicos da pintura. Em sua obra, uma tela se desdobra em duas partes complementares, o que foi recortado de uma composição dá origem a uma nova, criando um jogo de continuidade que se estende além das paredes da galeria.
Nas palavras de Lima, o trabalho pode começar na sala e terminar no corredor da casa do colecionador, uma provocação que atravessa espaços e propõe conexões visuais e conceituais entre ambientes. Combinando maturidade artística e inquietação criativa, a Galeria Clima reforça na SP Arte seu compromisso com obras que transcendem a estética e tocam questões profundas do nosso tempo.

Com sede em Salvador (BA), a Paulo Darzé Galeria de Arte chegou à SP-Arte com uma seleção enxuta e poderosa. Sob a direção de Thaís Darzé, a galeria apresentou três nomes consagrados do cenário nacional, mas foi com a aposta em Mirela Cabral que veio a surpresa mais vibrante.
Jovem e espontânea, a artista tem chamado atenção pela qualidade e inventividade de sua produção, especialmente com uma série de pinturas em cerâmica que se destacaram nesta edição da feira. Com um olhar que transforma o suporte rígido em campo de experimentação, suas obras mantêm o rigor da pintura ao mesmo tempo em que provocam com formas e texturas inusitadas.
A resposta do público foi imediata, praticamente todas as obras foram vendidas ainda nos primeiros dias de evento. Thaís comemora a oportunidade de apresentar um nome que promete crescer ainda mais nos próximos anos. As peças de Mirela, embora delicadas em dimensão, carregam uma força expressiva que as coloca com firmeza no radar da nova cena contemporânea.

Para Janaína Torres, da Janaina Torres Galeria, os holofotes se voltam para dois nomes que prometem marcar presença com força nos próximos anos: Marga Ledora e Caio Pacela.
A artista Marga Ledora, que há quatro décadas constrói uma obra sensível e consistente, acaba de conquistar sua primeira exposição institucional — aberta ontem na na Pina Estação, em São Paulo —, um reconhecimento tardio, mas merecido, à potência de sua trajetória.
Já Caio Pacela se prepara para sua primeira individual na capital paulista, prevista para outubro. Com narrativas visuais distintas, mas igualmente instigantes, os dois artistas representam a convicção da galeria em investir em talentos que transitam entre memória, identidade e experimentação estética.