Por Elaine Leme
“Tu vai ver o que nunca viste…”. A fala de Teresa, interpretada por Denise Weinberg em “O Último Azul”, convida o público a se aprofundar no novo filme do diretor Gabriel Mascaro, que trata de questões como o etarismo e a luta pela liberdade em uma sociedade autoritária.
No longa-metragem, que está em cartaz nos cinemas brasileiros, o diretor mergulha em um governo distópico que decide que os idosos devem ser enviados para colônias distantes em nome da produtividade econômica.
Teresa, 77 anos, funcionária de um frigorífico de jacarés em um distrito industrial no centro da Amazônia, recusa-se a aceitar esse destino e opta por embarcar em uma jornada de experiências pelos rios da floresta em busca de realizar o seu sonho: andar de avião.
A trama, ao mesmo tempo íntima e coletiva, constrói uma reflexão sobre o desejo incontrolável de viver. Em meio a um Brasil distópico, acompanhamos a resistência de Teresa, uma mulher que insiste em escrever sua própria história diante da tentativa de silenciamento de toda uma geração.
“Protagonizar a Teresa é um presente”, afirma a atriz Denise Weinberg. “É mostrar o envelhecimento de uma forma bonita, não triste ou melancólica, depressiva, neste horror que a gente coloca o envelhecimento. Eu prezo minhas rugas, eu valorizo o meu corpo idoso. É muito importante mostrar aos idosos e jovens que envelhecer é uma dádiva,” continuou.
Aos 69 anos, Denise reafirma sua presença marcante no cinema brasileiro com uma performance arrebatadora, que lhe rendeu o Prêmio Maguey de Melhor Atriz no Festival de Guadalajara.
No elenco estão nomes como Rodrigo Santoro, que interpreta o barqueiro Cadu, o ator Adalino, como Ludemir, que tem uma pequena aeronave clandestina, porém não consegue decolar com ela. E a atriz cubana Miriam Socarrás, que vive Roberta, uma vendedora de bíblias digitais, mas que não é religiosa, entre outros.
Algumas das cenas mais emocionantes são divididas entre Teresa e Roberta, que mantêm uma relação de cuidado uma com a outra. As personagens, entregam atuações extraordinárias e cheias de poesia, desafiam o etarismo e os estereótipos associados à velhice. “Eu amo a amizade delas”, afirma Denise. A relação íntima entre Teresa e Roberta é bastante singular. Trata-se de uma parceria que demonstra que é possível ser feliz e independente, mesmo na solidão.”
O filme brasileiro conquistou o Urso de Prata no 75º Festival de Berlim, além disso, recebeu os prêmios de Melhor Filme Ibero-americano de Ficção e Melhor Interpretação (para Denise Weinberg) no Festival Internacional de Cinema de Guadalajara e foi o filme de abertura do mais recente Festival de Cinema de Gramado.
Para diretor Gabriel Mascaro, o tema tem um senso de urgência, já que há pouquíssimos filmes com protagonistas idosos no cinema.
“O que busquei nesse filme foi romper com o imaginário tradicional e a expectativa de gênero, colocando uma idosa como protagonista em um enredo que mistura estilos pouco associados a esse corpo. Por que uma pessoa idosa não poderia ser rebelde? A trama parte justamente dessa distopia: uma mulher que se recusa a aceitar o destino imposto e foge em busca de um último desejo. É uma narrativa que fala de distopia, mas também de utopia, liberdade, sonho e da potência de uma mulher idosa que deseja”, comenta.
Imbuído da ideia de conjugar o corpo “idoso libertário” , o diretor e sua equipe, quiseram contar a história de uma mulher idosa no presente, pulsante, desejante, capaz de redescobrir a vida.
“O Último Azul” é sobre liberdade, sobre um corpo rebelde que se recusa a aceitar o destino imposto. Por que um idoso não poderia protagonizar uma narrativa de rebeldia contra o sistema? Esse filme é, antes de tudo, sobre a potência libertária que esse corpo pode inspirar em todos nós”, explica.
Assista ao trailer de O Último Azul
