A necessidade de se reinventar para sobreviver fez Reny Filho, de 46 anos, vestir-se de prata, pintar rosto e cabelo de purpurina e criar o personagem Homem do futuro prateado. Artista de rua, com curso de teatro no Rio de Janeiro e figuração em novelas da Rede Globo nos anos 90 no currículo, ele deixou a Cidade Maravilhosa para ser estátua viva em alguns pontos de grande fluxo de Goiânia há 17 anos.
Nascido em Caturaí, a 44 km da capital, Reny soube que queria ser artista aos 10 anos. “E isso não foi fácil”, contou. Ele se aventurou por outras atividades, em que percebeu que gostava de trabalhar nas ruas, como ser camelô. Sem dinheiro se manter no Rio, foi o prateado que rendeu trocados diários na volta para perto de casa e iniciou o que ele chama de “uma nova etapa da carreira”.
Reny chega a seu ponto de trabalho na GO-060, no cruzamento com a Avenida Castelo Branco, por volta das 10h. Ele se apresenta ali desde 2004. De bermuda, camiseta e chapéu prateado, carrega uma sacola de supermercado, onde guarda a fantasia. Ele se arruma sob as sombras das árvores. Retoca a vestimenta com tinha spray, encaixa um pequeno espelho em um tronco, joga água no rosto e cabelos para fixar a purpurina (hidrante e protetor solar, passou ainda em casa). É o brilho que o transforma.
Em 10 minutos, passa de anônimo que acabou de saltar de um ônibus a uma figura bastante conhecida. “Sem pintura, ninguém me conhece. Mas se estou com pintura, todo mundo me conhece. Falam ‘ôh, prateado’, ‘olha o prateado ali’”, relatou. Reny fica feliz com o reconhecimento do público. A relação com os admiradores foi construída por meio de apresentações em pontos que ele mal consegue enumerar: Feria da Lua, Feira do Sol, Pecuária, Parque Mutirama, shoppings…
O Homem do futuro prateado coleciona histórias de sustos e de gente que não percebe que ele não é estátua, a ponto de deixar escapas flatulências e abanar disfarçando. Segundo ele, que conta a história rindo bastante, isso já aconteceu. Da maior parte da rotina de apresentações, Reny tem boas lembranças. A exceção foi um pedido para lavar o rosto em um posto de gasolina depois do expediente anos atrás. “O moço falou: ‘você pensa que isso é de graça?’” Ele se sentiu ofendido e nunca quis receber outra negativa. Desde então, ele vai embora caracterizado.
Com o tempo decorado do semáforo, que fica 2 minutos fechados e 30 segundos aberto, Reny toma conta da faixa de pedestres. Faz um sinal de proteção para agradecer a vida, se movimenta como um robô, samba e tira o chapéu. Bem de vez em quando, a pescaria é graúda. Ganhou dez notas de 100 reais desde 2000. As de 50 reais são mais frequentes. Mas moedinhas e trocados são os que asseguram o sustento.
De pouquinho em pouquinho, ele conseguiu comprar uma casa, um carro. É casado há 25 anos, tem dois filhos e três netos, que dizem ter um “avô herói e outro avô prateado”. Ter uma moradia era uma meta de vida. “A gente vê tanto artista famoso que não tem uma casa”, justificou. O Homem do futuro preteado já viajou quase o Brasil inteiro para se apresentar em festas.
Todo ano, ele vai a Festa do Peão de Barretos (SP). Parece ter muito orgulho deste evento especificamente. Andou pelo nordeste, dormiu em muita rodoviária. Chegou a trabalhar 22 horas consecutivas. Nos últimos tempos, desacelerou um pouco. Mas está longe de desistir do que faz. “Às vezes não dá tanto dinheiro, mas só a alegria de estar no meio do povo, aquilo é ótimo.”