A série documental Diaspóricas — que vem ganhando projeção por seu protagonismo feminino negro no cinema e na música — parte, pela primeira vez, para fora do Brasil, em conexão com África. Até o dia 11 de julho, uma equipe reduzida de integrantes do projeto embarca rumo a Cabo Verde para as gravações de sua 4ª temporada. A novidade marca uma virada na trajetória da série, que, até então, se dedicou a narrar histórias de musicistas negras do Centro-Oeste brasileiro.
O projeto Cabo Verde do Entorno ao Retorno, que leva o grupo à sua primeira experiência de internacionalização, foca em visibilizar a importância da conexão com Cabo Verde e a necessidade do retorno em África que mulheres negras da diáspora têm, para se assentarem e entenderem a si mesmas a partir de memórias ancestrais do continente-mãe.
Guiada pela temática Oralituras, a temporada prioriza um olhar sobre as tradições orais e a voz de mulheres de África inscrevendo memórias na história de aproximação cultural entre Brasil e Cabo Verde. A nova temporada será registrada em Praia, capital cabo-verdiana, com artistas de grande expressão no país e internacionalmente.
Nesta, a cantora e compositora brasileira Nara Couto se encontra simbólica e, em alguns momentos, presencialmente com as cantoras Zul Alves, Kady, Fattú Djakité e com o grupo de batucadeiras Delta Ramatxada, representantes do ritmo tradicional cabo-verdiano batuku. As gravações ainda contarão com uma passagem por Lisboa, onde a equipe encontra Kady. A iniciativa tem o apoio do Centro Cultural Brasil Cabo Verde.
Exibições
Mais do que filmar, Diaspóricas também propõe encontros. No dia 3 de julho, o Centro Cultural Brasil-Cabo Verde recebeu exibições de episódios das duas primeiras temporadas da série, seguidas de roda de conversa.
As atividades contaram com a presença do coletivo Nhãnhas, grupo de cineastas e pesquisadoras cabo-verdianas ligadas à universidade, que também exibirão seus filmes fortalecendo o intercâmbio entre realizadoras dos dois países.
Sobre Diaspóricas
Criado em 2022, o projeto Diaspóricas surgiu como série de curtas documentais, que narram histórias de mulheres negras e suas trajetórias na música brasileira a partir do Centro-Oeste do país.
As duas primeiras temporadas, com cinco episódios cada, estão disponíveis gratuitamente no YouTube, e a terceira está em fase de pós-produção, com previsão de lançamento para o segundo semestre desse ano.
O projeto também deu origem a dois longas-metragens homônimos: Diaspóricas e Diaspóricas 2, o primeiro, premiado em festivais de cinema internacionais e o segundo, em fase de distribuição.
Na quarta temporada, a série se expande em uma travessia afro-atlântica. “A música brasileira é uma mulher negra e nossa herança cultural brasileira como um todo descende de culturas africanas”, afirma a idealizadora e diretora do projeto Ana Clara Gomes.
“Ela [a música] é feita pelas mãos, bocas e ouvidos de mulheres negras que carregam a ancestralidade como força criativa. Diaspóricas são essas mulheres — sonoras, negras, centrais, que encontram, na música, um modo de resistir, de existir, e de construir o Brasil e nossa brasilidade”.
Artistas confirmadas na nova temporada
– Nara Couto
Nascida em Salvador, capital baiana, Nara Couto é cantora, compositora, bailarina, atriz e pesquisadora de culturas africanas e afro-brasileiras. A multiartista, radicada em São Paulo, começou a pesquisar, ainda adolescente, sobre a relação da musicalidade baiana com o continente africano.
Influenciada pelas batidas do bloco afro Ilê Aiyê, se especializou em dança afro contemporânea. Atuou no Balé Folclórico da Bahia e com grandes artistas da música brasileira, ingressou na Orquestra AfroSinfônica, em 2009, como vocalista mezzo soprano até iniciar sua carreira solo.
– Kady
Cantora e compositora cabo-verdiana, Kady mora em Lisboa, Portugal, e é reconhecida por sua voz aveludada e pelas letras politizadas que abordam empoderamento feminino, identidade africana e aceitação.
Seu trabalho mescla sonoridades tradicionais e contemporâneas da música pop, ressignificando ritmos como a kizomba com uma estética única e engajada politicamente.
– Fattú Djakité
Nascida na Guiné-Bissau e radicada em Cabo Verde desde a infância, Fattú é cantora, compositora, artista plástica e ativista social. Com carreira iniciada ainda na adolescência, ela tem passagens marcantes por palcos de países europeus e africanos.
Fundadora da banda Azagua, Fattú é reconhecida por seu ativismo e por músicas que falam de liberdade, ancestralidade e empoderamento feminino.
– Zul Alves
Artista da cidade da Praia, Zul é considerada uma voz inovadora na cena musical cabo-verdiana. Seu álbum Buska traça uma linha de diálogo entre as raízes tradicionais e as novas tendências, com sonoridade que une ritmos diversos do arquipélago.
A artista se define como uma “tradicional moderna”, criando pontes entre passado, presente e futuro sonoro de Cabo Verde.
– Delta Ramantxada
Um grupo de batuku cabo-verdiano, fundado por Marisa Correia Ramantxada, que divulga o universo cultural do Tarrafal, na ilha de Santiago, e de Cabo Verde como um todo.
O grupo, com mais de 20 anos de existência, é considerado uma referência no batuku cabo-verdiano, gênero musical que mescla percussão, canto, resposta e dança, geralmente entre mulheres. O grupo já representou o país em eventos internacionais, como o Festival da Lusofonia em Macau, na China.