Uma técnica que detecta no sangue pequenas quantidades de uma proteína fragmentada, ligada à doença de Alzheimer, pode levar a um exame simples que possibilita o diagnóstico anos antes de aparecerem os sintomas. O estudo foi publicado terça-feira na revista científica Journal of Experimental Medicine e apresentado no mesmo dia na Conferência Internacional da Associação de Alzheimer em Chicago (EUA).
Uma das boas notícias, no caso, é que o teste pode, potencialmente, tornar o diagnóstico mais simples, barato e portanto acessível a um número muito maior de pessoas.
Pesquisadores de quatro países liderados pela Universidade de Lund, na Suécia, observaram que os níveis da proteína P-tau-27, abundante no sistema nervoso central e no sistema nervoso periféricos, aumentam durante as etapas iniciais do Alzheimer. Eles estimam que o método, baseado nessa proteína, poderia detectar as mudanças cerebrais até 20 anos antes de aparecerem os sintomas da doença.
Numa avaliação da notícia para o New York Times, o dr. Michael Weiner, pesquisador do assunto na Universidade da Califórnia – e que não participou do estudo – disse que “ainda não é uma cura, não é um tratamento, mas ninguém consegue tratar uma doença antes de ter um diagnóstico. E um diagnóstico preciso, a baixo custo, é algo incrível, um avanço decisivo”.
Na mesma linha, o professor de neurologia da Harvard Medical School, Rudolph Tanzi, ponderou também para o jornal americano que “os resultados precisam ser aplicados em testes clínicos com outras populações, incluindo as que representem mais diversidade étnica e racial”. Ou seja, não é nada para amanhã. Aguardado há tempos pela comunidade médica, o diagnóstico, para ser usado clinicamente, precisa ainda passar por mais etapas de pesquisa. Cientistas acreditam que, se comprovados os benefícios, técnica poderia estar disponível para uso clínico em três anos.
30 milhões
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a doença é a forma mais comum de demência e representa entre 60% e 70% de todos os casos de síndromes envolvendo deterioração de memória, pensamento, comportamento e a capacidade para realizar atividades diárias.
No mundo, segundo os números mais recentes, há cerca de 30 milhões de pessoas afetadas pelo Alzheimer. Perceptível com mais frequência em pessoas acima de 65 anos, a condição começa antes em cerca de 5% dos casos. O tempo médio de vida do paciente vai de três a nove anos e o atendimento a essa população é hoje um dos tratamentos mais caros da medicina nos países desenvolvidos.
“Existe uma necessidade urgente de ferramentas que sejam simples, de baixo custo e não invasivas para esse diagnóstico”, disse Maria Carrillo, cientista e porta-voz da Associação de Alzheimer dos Estados Unidos. “A possibilidade de uma detecção precoce, que permita intervir com tratamento antes que a doença cause perdas significativa no cérebro, seria uma grande mudança para os pacientes, para as famílias e também para o nosso sistema de saúde”, acrescentou a cientista.
Rastreando a proteína
A doença de Alzheimer é caracterizada pela presença de placas, que formam no cérebro uma proteína chamada amilóide B e aglomeração da proteína tau. Esta é responsável por formar “nós” de fibras nos neurônios dos pacientes. Atualmente, as mudanças cerebrais que acontecem antes da manifestação de sintomas podem ser vistas somente em tomografia por emissão de pósitrons (conhecida pela sigla em inglês, PET) ou medindo as proteínas amilóide e tau no líquido na medula espinhal.
Os cientistas envolvidos na pesquisa já haviam descoberto que um fragmento modificado da proteína tau, conhecido como P-tau-217, se acumula no líquido da espinha (também chamado de líquor ou líquido cefalorraquidiano) dos pacientes antes que apareçam os sintomas cognitivos. Esse fragmento aumenta o progresso da doença e pode prever com precisão a formação de placa amilóide.
Os pesquisadores também estimaram que a P-tau-217 poderia ser encontrado no sangue de pacientes com Alzheimer, embora em níveis muito baixos que dificultariam a detecção.
A equipe desenvolveu um método baseado em espectrometria de massa para medir a quantidade desse fragmento e outros da proteína tau em apenas 4 mL de sangue, mesmo que as amostras sejam tão pequenas e contenham menos de um bilionésimo de grama de P-tau-217.
Os cientistas também perceberam que, como ocorre com os níveis deste fragmento no líquor, os níveis de P-tau-217 no sangue eram muito baixos em voluntários saudáveis, mas se mostravam mais elevados em pacientes com placas amiloides, mesmo naqueles sem sintomas cognitivos. (Com agências internacionais)
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.