Concessionários do serviço de transporte público da Região Metropolitana de Goiânia (RMG) entraram com mandado de segurança para cassar liminar da Justiça do Trabalho a qual obriga as empresas a realizarem testes, contra covid-19, em todos os funcionários. O instrumento jurídico tramita desde a última segunda-feira (29/6) no Tribunal Regional do Trabalho (TRT). A liminar da Justiça do Trabalho determina que a testagem seja feita em até 10 dias.
De acordo com Patrícia Miranda, advogada autora do recurso, o texto do mandado de segurança se baseia em três argumento principais: 1) a falta de ‘cientificidade’ da medida sugerida, pois contraria recomendações de órgãos de saúde e de pesquisa; 2) a falta de ‘precisão jurídica’ do texto, pois fere, segundo Miranda, o Princípio da Legalidade, da Administração Pública, o qual determina a necessidade de lei prévia para a obrigatoriedade da implementação da decisão; e 3) a situação financeira das empresas do transporte na Região Metropolitana de Goiânia, em meio à pandemia, com a diminuição de passageiros e, consequentemente, de arrecadação.
Testes rápido e sorológico não deveriam ser alternativas ao RT-PCR na identificação do covid-19, diz cientista
De acordo com a pesquisadora Natalia Pasternak, doutora em microbiologia pela Universidade de São Paulo (USP), em entrevista ao programa de entrevistas Roda Viva, os testes rápido e sorológico se mostraram ineficazes como meio de detecção do covid-19.
Durante a entrevista, a especialista reforçou que o RT-PCR “é o único teste que diz se a pessoa está ou não está com o vírus”, pois determina o material genético do vírus. Assim, a subnotificação pela falta de testes e a impossibilidade de fazer o isolamento de pessoas contaminadas e outras que possam ter tido contato com o covid-19, seriam, para Pasternak, o resultado da falta de investimento em insumos para a produção de testes tipo RT-PCR.
“Temos visto pessoas comprando testes na farmácia e depois comemorando, porque o resultado deu negativo, quando, na verdade, o teste [rápido] e sorológico mede anticorpos, completamente diferente daquele que mede o vírus, que é o [teste] RT-PCR. O teste [rápido e sorológico] vai dizer se você teve contato com o vírus no passado e se desenvolveu anticorpos. Só vai ser bom e eficiente se for capaz de detectar anticorpos em seu sangue, o que a maioria dos testes de farmácia não faz, [pois] são ruins. Além de tudo, a qualidade deles é duvidosa; a sensibilidade deles é baixa; podem dar muitos erros tanto de falso-negativos quanto de falso-positivos; querendo dizer que eles [testes] podem falhar em dizer se você tem anticorpos, porque não conseguiram detectá-los, [assim] como podem enganar e dizer que você tem anticorpos quando na verdade não tem. Além do mais, a interpretação deles piora o resultado, porque pessoas olham para os testes [rápido e sorológico] e acreditam não estar com o vírus”, diz.
A pesquisadora também ressaltou os perigos dos resultados “falso-positivos”, uma vez que é comum a pessoas, a partir dos resultados enganosos, deixarem de cumprir as medidas preventivas, tais como uso de máscaras, isolamento social, contato com pessoas de risco etc, acreditando-se imunes ao covid-19.
Entenda o modo de tarifação e financiamento do transporte público da Região Metropolitana de Goiânia
Parte dos usuários do transporte público da Região Metropolitana de Goiânia possui algum tipo de subsídio: trabalhador formal (todo valor excedente a 6% do salário), idosos, estudantes. Assim, os mais vulneráveis (desempregados; informais; e os mais pobres, os quais não se enquadram nas “gratuidades” citadas acima) são aqueles sem acesso ao ônibus a valor acessível destinado ao deslocamento diário.
Fora alguns tipos de subsídios, como o estudantil e o pago pelo empregador, por exemplo, o transporte público é financiado pela quantidade de usuários que utiliza o sistema e paga a passagem. Há também subsídio aos combustíveis, mas é uma ação recente. Assim, quanto menor o número de passageiros, maior o valor a ser pago por passageiro em cada ‘viagem’. No Brasil, como aponta Nota Técnica do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea), Tarifação e financiamento do transporte público urbano, o transporte público coletivo sofreu perda considerável de usuários. Entre 2013 e 2017, 25% dos passageiros.
Para pesquisadores, como a doutora em Planejamento de Transportes Erika Kneib e o pós-doutor em Planejamento de Transportes nos Países em Desenvolvimento Eduardo Vasconcellos, essa perda de demanda, que afeta o valor da passagem cobrada, é o resultado de vários fatores, que vão do incentivo ao transporte motorizado individual a uma questão cultural, brasileira, a qual não prioriza o transporte público, seja na elaboração de políticas públicas ou na organização do trânsito ou até na falta de financiamento estatal ao sistema, comum em outros países, desenvolvidos ou emergentes.
Como demonstra o documento elaborado pelo Ipea quando das manifestações de 2013, todos esses fatores tendem a elevar o preço da passagem, pois ela, passagem, ‘banca’ os custos essenciais do sistema de transporte público. “Assim, se pensarmos em aumentos de insumos e diminuição de usuários, obviamente, teremos um cenário em que a receita tarifária apresenta[rá] algumas distorções. Uma delas está relacionada à perda de demanda no sistema devido ao aumento do custo da passagem. Quando esse fato ocorre, e na última década no Brasil verificou-se esse movimento em função do avanço do transporte individual, o nível da tarifa torna-se cada vez mais alto para compensar a diminuição do número de tarifas pagas, o que induz novas perdas de demanda, retroalimentando o ciclo vicioso que se forma em função da dependência das camadas mais carentes da população em relação ao transporte público urbano e sua baixa capacidade de pagamento”, diz a Nota N° 2, do Ipea.