O atacante Giovani Felippi, de 19 anos, está preocupado com o quanto a paralisação do futebol pela pandemia do novo coronavírus pode prejudicar o seu desenvolvimento como jogador profissional. Atleta da base do Atlético-MG e às vésperas de terminar o ciclo de formação, teme que a interrupção do calendário o faça perder tempo de aprendizado e até desperdice oportunidades para ser promovido ao elenco principal.
A insegurança enfrentada por Giovani se repete em outras centenas de garotos brasileiros com menos de 20 anos, idade limite antes de assinarem novo contrato. O coronavírus forçou os clubes a interromperem os trabalhos e levou os futuros profissionais a perderem tempo. “A parte física e tática ainda conseguimos amenizar devido às atividades aplicadas pelo clube, mas a parte técnica com certeza será mais prejudicada”, disse o atacante do time mineiro.
O Estado conversou com treinadores e gestores especializados em categorias de base para entender o tamanho do prejuízo para esses meninos. “As (categorias) menores ainda estão em um processo inicial. As ideias coordenativas, técnicas e táticas ainda não estão consolidadas. Eles vão perder muito, vão se atrasar neste aspecto”, afirmou o treinador do time sub-20 do Bahia, Carlos Amadeu, ex-técnico da base da seleção brasileira. “Teremos uma perda sem precedentes na formação da base”.
Os clubes demonstram mais preocupação com o impacto psicológico da paralisação, em especial para quem está no processo final das categorias de base. “O relógio vai correndo agora. O menino de 20 anos está com um tempo menor de exposição porque está parado há seis semanas”, comentou o técnico do sub-20 do Fluminense, Eduardo Oliveira. Quem atua nesta categoria perde a chance de disputar um calendário anual que passa até de 60 jogos. Parte dos compromissos tem transmissão da TV e representa uma vitrine.
Já para os meninos mais jovens, a paralisação atrapalha o processo de crescimento. Em geral, as equipes costumam monitorar esse aspecto principalmente em garotos de 14 a 17 anos, pois em poucos meses os atletas dessa faixa etária ganham estatura e precisam ser submetidos a avaliações que servem para nortear o cronograma de treinos físicos.
“Os meninos crescem muito rápido entre 14 e 17 anos. Se não tiver um treino adequado e um bom aproveitamento, a formação pode ser comprometida. É preciso ter um trabalho individualizado e um acompanhamento fisiológico e na parte de fisioterapia”, afirmou o consultor das categorias de base do Fortaleza, José Carlos Brunoro.
Os clubes brasileiros têm procurado minimizar os problemas causados pela paralisação com orientações por vídeo. O Atlético-MG passa treinos e cartilhas aos garotos. A diretoria montou um esquema logístico para tirar mais de 91 meninos do alojamento em Vespasiano (MG) e mandá-los de volta para suas casas no começo da quarentena. Giovani Felippi, por exemplo, está em Batayporã (MS) e precisa enviar o relatório do cumprimento das atividades.
“Os garotos estão amadurecendo à força, porque voltam para casa e muitas vezes para uma outra realidade. Muitos deles têm famílias em condição socioeconômica complicada e agora enfrentam condições de vida e de alimentação inferiores às que encontram quando estão morando na Cidade do Galo”, disse o coordenador da base do Atlético-MG, Júnior Chávare.
Em sua opinião, quando for possível o retorno da base, será preciso analisar a modificação do calendário para poder conciliar o futebol com a possível reacomodação de aulas escolares. “Alguns torneios terão de ser sacrificados. É importante não prejudicar quem estuda”.