No dia 13 de dezembro de 2019, o jovem Lucas Aquino, de 22 anos, fez as malas e embarcou para a cidade de Ningbo, na China. Lucas, engenheiro civil recém-formado, chegou à cidade, que se situa na província de Zhejiang, para visitar sua irmã, onde reside há cerca de três anos. Entretanto, a viagem teve de ser encurtada devido ao surto de coronavírus que afeta o país. Para se ter uma noção, quase 160 casos do vírus foram diagnosticados em Ningbo, onde Lucas estava. Mas ao contrário dos repatriados que cumpriram quarentena em Anápolis, o jovem não foi submetido a absolutamente nenhum tipo de monitoramento, e sequer teve a temperatura aferida ao pisar em solo brasileiro.
O novo agente do coronavírus, o SARS-CoV-2, da família de vírus que causam infecções respiratórias, foi descoberto no dia 31 de dezembro do ano passado após casos registrados na China. Ele provoca a doença chamada de coronavírus, o COVID-19. Um total de 80 mil pessoas já foram infectadas ao redor do mundo e, só na China, o número de mortes causadas por ele já está em mais de 2.700.
Lucas chegou a Ningbo no dia 13 de dezembro. Nesta época, a doença já se espalhava por Wuhan, cidade epicentro do vírus, mas o alerta ainda não havia sido dado. Segundo o engenheiro civil, seus planos eram de ficar no país asiático até o dia 7 de fevereiro, entretanto, devido ao surto da doença, o jovem decidiu adiantar sua passagem e voltou ao Brasil ainda em janeiro. Ele desembarcou no Aeroporto Internacional de Brasília no dia 29, após fazer uma escala em Frankfurt, na Alemanha e em Guarulhos, São Paulo. Menos de uma semana depois, sua irmã, juntamente com seu marido e filhos, também vieram para o Brasil, no dia 11 de fevereiro.
De acordo com o site Ncov.dxy.cn, criado para monitorar o avanço do coronavírus na China, a cidade de Ningbo, onde ele estava com sua irmã e cunhado, teve uma total de 157 notificações confirmadas de pessoas infectadas pelo coronavírus. Desses, 137 foram curadas. Entretanto, o engenheiro de Ceilândia chama a atenção para um fato: tanto ele quanto a família não passaram por qualquer tipo de monitoramento quando chegaram ao Brasil, nem mesmo o mais simples, como a aferição da temperatura.
Lucas relata que, no aeroporto na China, teve que preencher um questionário – que perguntava, inclusive, sobre qualquer possível passagem por Wuhan -, e também usar a máscara apropriada. Entretanto, no Aeroporto Internacional de Guarulhos, onde desembarcou antes de rumar para o Aeroporto Internacional de Brasília, não houve qualquer tipo de procedimento padrão. “Quando cheguei [no Aeroporto], não tive que passar por nenhum procedimento. A única coisa que tinha eram alertas sonoros sobre o coronavírus, mas nem mediram minha temperatura”, revela.
O jovem conta que desde que chegou ao Brasil, no dia 29 de janeiro, não apresentou nenhum sintoma característico da doença causada pelo coronavírus, como tosse seca, febre, cansaço, congestão nasal e inflamação na garganta, e não viu necessidade de procurar nenhuma unidade de saúde. O período de incubação do vírus pode variar entre dois a 14 dias.
A situação em Ningbo depois do coronavírus
Natural de Ceilândia, região administrativa do Distrito Federal, Lucas conta que, desde que recebeu as primeiras notificações de coronavírus, o governo municipal de Ningbo tomou medidas drásticas para a contenção da doença. Segundo ele, quando deixou a cidade ela estava quase esvaziada devido ao Ano Novo Chinês, comemorado no dia 25 de janeiro, período em que muitas pessoas viajam. Entretanto, inúmeros locais passaram por isolamento e foram submetidos pelo governo a quarentenas.
Além disso, os cidadãos aderiram às máscaras e estão transitando nas ruas fazendo o uso delas. Entretanto, o cenário na cidade esteve pior. “Quando apareceu o surto de coronavírus, não se via ninguém nas ruas”, relembra Lucas.
Três cidades da província de Zhejiang – Taizhou, Wenzhou e partes de Ningbo – adotaram as mesmas medidas, o que afeta 18 milhões de pessoas.
Monitoramento não está sendo feito por “questão de logística”, diz Ministério da Saúde
A reportagem do Dia Online entrou em contato com o Ministério da Saúde por e-mail e foi respondida por ligação – uma vez que, segundo o ministério, o e-mail está congestionado -, sobre o caso em questão. A reportagem questionou quais os critérios usados para a realização de monitoramento de brasileiros vindos da China, especificamente de locais que receberam notificações de casos da doença. De acordo com a assessoria da pasta, qualquer tipo de monitoramento, assim como a quarentena, só é feita em caso de apresentação de sintomas por parte do indivíduo.
Questionado sobre o porquê de os repatriados que ficaram em Anápolis terem passado pelo processo de quarentena mesmo sem apresentarem sintomas, a pasta respondeu que se tratava de caso especial, uma vez que os mesmos estavam em Wuhan, cidade com o maior número de diagnósticos de coronavírus.
A reportagem também questionou sobre o período de incubação do vírus, que pode chegar a 14 dias, uma vez que há a possibilidade de indivíduos infectados só apresentarem sintomas depois de chegar ao Brasil. De acordo com o ministério, não é possível fazer o monitoramento de todos que chegam “por uma questão de logística”. Neste caso, ainda conforme a assessoria da pasta, a pessoa que apresentar sintomas após chegar ao Brasil deve procurar uma unidade de saúde para ser atendida.