Meu Querido Filho, de Mohamed Ben Attia, terá sessão especial nesta quarta-feira, 9, no Cine Caixa Belas Artes, promovida pelo Estado, Pandora Filmes e Caixa Belas Artes. Após a projeção, o longa será debatido pelo editor Ubiratan Brasil e o crítico Luiz Carlos Merten, do Caderno 2. A iniciativa, uma parceria entre o jornal e o cinema, já promoveu debates de outros filmes, entre os quais A Amante, do próprio Ben Attia. A sessão começa às 19h30 e os ingressos gratuitos começam a ser distribuídos às 18h30 na bilheteria do cinema.
Mohamed Ben Attia é um cineasta a quem se deve atenção. Seu olhar sobre a sociedade tunisiana nada tem de rotineiro. Já se via isso em A Amante, quando tratava de um casamento arranjado e das perturbações que o desejo e a ânsia de liberdade podem causar em tal tradição. Agora vai mais longe e defronta-se com o tema espinhoso da Jihad, a guerra santa islâmica.
Na história, há um núcleo familiar em aparência bastante sólido. Riadh (Mohamed Dhrif) trabalha como operador de guindastes no porto de Túnis e está prestes a se aposentar. Sua esposa, Nazil (Mouna Mejri), tem uma ocupação que a obriga a viagens constantes. Nada disso parece perturbar o casal, que só tem uma preocupação – o filho Sami (Zakaria Ben Ayyed), que se prepara para o vestibular, vem apresentando um problema de saúde, uma enxaqueca persistente. Nada que venha a perturbar em excesso o equilíbrio familiar, mas, mesmo assim, o pai insiste com o filho que consulte um médico.
Os sintomas, claro, funcionam como uma espécie de metáfora do que está por vir, as dores de cabeça que a conduta misteriosa do filho passa a causar à família. Em especial ao pai, que toma a peito a tarefa de descobrir o paradeiro de Sami quando ele desaparece sem dar qualquer explicação.
Temos então um filme que toma caminhos diferentes. Primeiro, há o engano paterno em relação ao filho. Riadh pensa que Sami está perturbado, daí os sintomas de dores de cabeça, pela proximidade do exame vestibular, algo que de fato estressa demais os jovens. O que ele não sabe é que Sami encontra-se diante de uma decisão bem mais séria e radical sobre o seu futuro do que a escolha de uma profissão. Trata-se de uma bifurcação de caminhos entre a vida ou morte. E, nesse instante, ele está só. Mas o pai não sabe.
Assumindo de vez o ponto de vista paterno, o filme percorre então o que seria uma espécie de road movie do terror, com Riadh buscando o filho além das fronteiras de seu país. Apoiado em pistas tênues, ele tenta alcançar a Síria através da Turquia, servindo-se de “coiotes” que fazem a travessia clandestina a troco de dinheiro, claro.
Em entrevistas, o diretor tem dito que tirou a história de um fato real que ele soube através do noticiário, ouvido no rádio do carro. A reportagem falava da história de um pai que não havia hesitado em arriscar a própria vida para ir atrás do filho que se havia convertido ao radicalismo e aderido ao Estado Islâmico. Para tentar encontrar esse jovem e salvá-lo da morte certa, esse pai da vida real atravessa fronteiras como clandestino e tenta resgatá-lo em esconderijos do grupo radical. Dessa fonte realista de inspiração, Ben Attia tomou seu ponto de partida, que desenvolve com criatividade de artista e imaginação. Seu porto seguro será a questão: o que sentirá nessas condições um pai que ama seu filho?
Ben Attia oscila entre o registro real e o do sonho – no caso, o do pesadelo. Mesmo aí é ambíguo. Muito do que se apresenta como sonho pode ser, na verdade, um dado de realidade. Como se o pai, uma vez embarcado na aventura, não conseguisse mais distinguir uma dimensão da outra. Porque tudo, no fundo, se converte num grande e difuso pesadelo. Do qual ele tentará emergir. Mas Riadh nunca será o mesmo. O filme é perturbador. Deixa mais dúvidas que certezas. É magnífico.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.