Investigações realizadas por autoridades panamenhas, com ajuda da Suíça, mostram que as propinas pagas pela Odebrecht no Panamá superaram US$ 100 milhões e foram duas vezes superiores ao que a Justiça dos EUA estimou em 2016. O esquema envolveu pagamentos a mais de 70 pessoas, durante três governos diferentes.
Os dados fazem parte do inquérito conduzido pelo Ministério Público do Panamá, que contou com extratos bancários e informações enviadas pela Suíça. Durante o período investigado, as obras da Odebrecht sob suspeita envolveriam contratos de mais de US$ 9 bilhões. São 21 licitações públicas vencidas pela empresa sob exame.
As investigações esmiuçaram mais de 14 contratos no governo de Martín Torrijos, que terminou em 2009, e Ricardo Martinelli, entre 2009 e 2014. Já no atual governo de Juan Carlos Varela, que termina neste ano, são cinco obras sob análise, incluindo a Linha 2 do metrô avaliada em mais de US$ 2 bilhões.
Segundo apuração do Estado, em dez dos 21 contratos, o preço final pago pelas autoridades do Panamá para a construtora ficou acima dos valores previstos no orçamento. Um dos casos foi um túnel de saneamento, que passou de US$ 139 milhões, em 2009, para US$ 384 milhões quando a obra foi entregue, em 2013.
Em outro caso, nas obras para a Linha 1 do metrô, o orçamento final ficou mais de US$ 600 milhões acima do US$ 1,4 bilhão estimado inicialmente. Já a estrada Don Alberto Motta passou de US$ 280 milhões, em 2007, para US$ 488 milhões, em 2014.
A apuração do Estado identificou que uma parte substancial das informações partiu de forma espontânea dos suíços, que enviaram detalhes de contas e extratos bancários para que o caso pudesse ser investigado na América Central. Também foram consideradas as delações premiadas de ex-funcionários da Odebrecht no Brasil, a assinatura de um acordo com a empresa e confissões de outros suspeitos, como Mônica Moura, que trabalhou para campanhas eleitorais do PT.
No Panamá, os procuradores também passaram a contar com o instrumento da delação premiada e os resultados indicaram subornos acima dos valores inicialmente conhecidos. A Odebrecht afirma que colaborou nessa fase do processo.
Em 2016, o Departamento de Justiça dos EUA havia estimado que os pagamentos de propinas da Odebrecht no Panamá chegavam a US$ 59 milhões. Agora, mesmo com o inquérito ainda em andamento e faltando cerca de 20% para a investigação ser concluída, a marca dos US$ 100 milhões já foi ultrapassada.
Caminho
Parte da dificuldade em encontrar a dimensão total do esquema resulta da sofisticação na forma de fazer o dinheiro chegar aos beneficiários. As investigações indicam que a construtora usou até quatro níveis de transações bancárias para camuflar os pagamentos. “O objetivo era que se perdesse o rastro do dinheiro”, explicou a procuradora do Panamá, Zuleika Moore.
Apenas uma parte dessa estrutura de quatro camadas se encontra na Suíça. As transferências a outros paraísos fiscais prejudicam a busca pelo dinheiro. Por enquanto, foram descobertas 18 empresas offshore que eram usadas para fazer o dinheiro circular por diferentes jurisdições.
A procuradora do Panamá dá uma nova dimensão da diferença entre o que era a descoberta original e o que já se sabe hoje. Em um dos casos específicos, a Justiça americana disse que dois suspeitos teriam recebido US$ 6 milhões da Odebrecht. “Com nossa investigação, determinamos que esse valor era de US$ 53 milhões”, disse Zuleika.
Um dos esquemas, que teria sido delatado por Mônica Moura, indica um “pagamento direto” para uma campanha presidencial no Panamá em 2014. Segundo a procuradora, a transferência de informação e de extratos da Suíça para seu gabinete mostrou que os valores iam além, usando uma conta secreta no país europeu em nome de um tesoureiro.
A propina não distinguia partido político nem posição ideológica. Entre 2006 e 2009, no governo de Martín Torrijos, os pagamentos foram de US$ 5,5 milhões. Entre 2009 e 2014, a Odebrecht teria pago mais US$ 96 milhões durante a gestão do presidente Ricardo Martinelli. Em troca, a empresa garantia contratos importantes de obras públicas.
Na lista de envolvidos estão Ricardo Alberto e Luis Enrique Martinelli Linares, filhos do ex-presidente do Panamá, diretores de bancos, ex-ministros de Obras Públicas, diplomatas, tesoureiros de partidos e dezenas de outros intermediários, políticos locais e seus parentes.
Segundo investigações, a construtora também teria financiado campanhas de três partidos panamenhos, assim como alguns dos principais candidatos. Entre eles estaria José Domingo Arias, que concorre às eleições de 5 de maio.
Procurada, a empresa indicou que, por conta de um acordo no Panamá, já pagou uma multa de US$ 220 milhões. “A Odebrecht admitiu responsabilidade sobre fatos que são objeto de investigação pelo Ministério Público do Panamá e, em julho de 2017, assinou um acordo de colaboração, já homologado judicialmente, o qual formaliza o compromisso de cooperação”, disse a assessoria de imprensa da construtora.
“Além da informação preliminar divulgada pelo Departamento de Justiça dos EUA, no sentido de que haviam sido feitos pagamentos em valor superior a US$ 59 milhões, desconhecemos quaisquer estimativas e percepções atribuídas às autoridades”, completou a empresa, por meio de sua assessoria. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.