Eterno candidato ao prêmio Nobel de Literatura, militante da paz entre palestinos e israelenses, o escritor Amós Oz morreu nesta sexta-feira, 28, em Jerusalém, cidade onde nasceu. O anúncio foi feito no Twitter por sua filha, Fania Oz-Salzberger. Ele estava com 79 anos e não foi informada a causa da morte, mas o autor sofria de câncer. “Meu querido pai acaba de falecer depois de uma rápida piora”, anotou Fania.
Um dos mais prestigiados escritores de seu país, com obra amplamente traduzida graças principalmente ao seu tom pacifista, Oz nasceu em 1939 como Amos Klausner, nove anos antes da formação do Estado de Israel. Mudaria o sobrenome para Oz – “força” – ao se revoltar contra o pai e passaria 30 anos no kibutz Hulda, onde se casou e teve três filhos. Após o serviço militar na Brigada Nahal das Forças de Defesa de Israel, estudou filosofia e literatura hebraica na Universidade Hebraica de Jerusalém.
Conhecido por suas inúmeras manifestações políticas pacifistas, ele era o ficcionista israelense mais lido nas dezenas de países onde seus livros foram traduzidos – foram mais de 45 idiomas. Por um motivo simples: em suas histórias, o cotidiano de pessoas comuns se mistura às dificuldades de uma comunidade em permanente conflito. Em De Repente, Nas Profundezas do Bosque, por exemplo, a narrativa começa com uma professora solteirona mostrando desenhos dos bichos que existiram outrora. As crianças, porém, riem e zombam da mestra, pois aprenderam em casa que tais bichos não passam de mitos dos quais nem é bom falar – um simples comentário pode despertar uma maldição e a boca pecadora contrai a “doença do relincho” e, tal qual o pobre menino Nimi, passa a se comportar como um potro.
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Oz iniciou sua carreira literária em 1961, quando tinha apenas 22 anos de idade. No total, publicou mais de 18 livros em hebraico, entre romances, coletâneas de contos e ensaios e cerca de 500 artigos e ensaios para periódicos internacionais – destacam-se Caixa-Preta, De Amor e Trevas e Mais de Uma Luz, sua última obra publicada no Brasil, em 2017. Nos últimos anos, sua obra foi editada aqui pela Companhia das Letras.
Antes de iniciar seus estudos universitários, Oz passou três anos na Brigada Nahal das Forças de Defesa de Israel e voltou ao serviço durante a Guerra dos Seis Dias de 1967 e a Guerra do Yom Kippur, em 1973. Foi depois de suas experiências no exército que Oz adotou uma rígida postura política, que o tornou um homem ativo na promoção do diálogo e da paz entre Israel e seus vizinhos árabes. Ele também escreveu extensivamente sobre o conflito de Israel com os árabes, pedindo diálogo e contenção.
Em 1978, Oz foi um dos fundadores do movimento Peace Now, que foi a primeira iniciativa em Israel contra os assentamentos e, em 1990, deixou o Partido Trabalhista para se juntar à formação esquerdista de Meretz.
Ao jornal espanhol El País, em que publicava frequentes colaborações, por exemplo, Oz comentou, em junho de 2010, sobre a carnificina cometida pelos militares israelitas contra o navio turco Mavi Marmara, que rumava a Gaza em solidariedade com a população sitiada, classificando como “repugnante” o cerco a que Israel submete a Faixa. Afirmava ainda que “o Hamas não é somente uma organização terrorista. É uma ideia desesperada e fanática que surgiu da desolação e da frustração de muitos palestinos”.
Já em abril passado, em entrevista à TV alemã, Oz revelou sua preocupação com a cidade de Jerusalém. “Não sei o que o futuro reserva para Jerusalém, mas sei o que deve acontecer. Todos os países do mundo devem seguir o exemplo do presidente americano Donald Trump e transferir sua embaixada em Israel para Jerusalém. Ao mesmo tempo, cada um desses países deveria abrir sua própria embaixada em Jerusalém Oriental como a capital do povo palestino”, disse ele, segundo cita o diário israelita Haaretz.
Se em sua escrita transbordava indignação contra os malefícios humanos, Amós Oz era, pessoalmente, um homem adorável. Com uma voz doce, conversava com fluência em um inglês, manso, preciso, mas carregado de determinação. O clima desértico parecia inspirar o escritor – ele se mudou para Arad em 1986, a fim de facilitar o tratamento de asma de seu filho caçula, Daniel. Anos depois, o garoto retornou a Jerusalém, mas ele decidiu ficar. Com um humor tão seco como o clima, Oz adaptou-se à amplidão desabitada, extraindo dali a fonte de sua inspiração ao habituar-se a acordar cedo para passeios matinais que lhe despertavam as dúvidas que moviam sua literatura: ao se posicionar na pele dos personagens, ele se questionava sobre o que faria se estivesse em seu lugar.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.