O início neste ano das atividades de grandes escolas particulares em São Paulo, que prometem formar alunos para serem “cidadãos globais”, inspirou colégios tradicionais da cidade a pensar ou adiantar mudanças no currículo e na carga horária. Período integral, proposta bilíngue, investimento em novas tecnologias, aulas interdisciplinares e voltadas para o cotidiano dos alunos são algumas das novidades adotadas.
Desde o anúncio da abertura de duas novas escolas de elite, Avenues e Concept, com a proposta de oferecer um “projeto pedagógico inovador”, o mercado de colégios particulares está agitado, seja pela troca de alunos ou de professores. Apesar de serem acessíveis para poucas famílias – a mensalidade delas chega a R$ 9,8 mil, mais do que o dobro do cobrado nas escolas tradicionais -, alguns pais ficaram preocupados de não oferecerem um ensino inovador para os seus filhos.
“Com esse novo mercado, fizemos um exercício de olhar para dentro. Primeiro, precisamos diferenciar o que é novidade e o que é inovação. Depois, pensamos nos nossos atributos e no legado. Avaliamos que iríamos fazer uma metamorfose, mas sem perder nossa identidade”, diz Esther Carvalho, diretora geral do Colégio Rio Branco, que tem 72 anos e fica em Higienópolis, na região central.
A escola reformulou o currículo do ensino fundamental 2 (do 6.º ao 9.º ano) para que as aulas fossem divididas em módulos, não mais em disciplinas. Ou seja, os alunos passaram a desenvolver projetos em que trabalham todas as matérias de forma integrada. Também aumentou a carga horária de Inglês.
Ela conta que também percebeu a necessidade de melhor comunicação com os pais para que entendam e opinem sobre o projeto pedagógico. “Temos rigor pedagógico grande, mas às vezes não comunicamos bem o que é feito. Essas escolas falam em formar um cidadão global. Há mais de dez anos nossos alunos fazem projetos com jovens do outro lado do mundo, são aprovados para Harvard, MIT (Massachusetts Institute of Technology, nos Estados Unidos). Isso é o quê? Ser cidadão do mundo não é só ser bilíngue.”
Com mais de 70 anos e um dos mais tradicionais da cidade, o Colégio Santa Maria, na zona sul, também decidiu este ano atender a uma demanda de anos dos pais: período integral para o ensino infantil e fundamental 1 (do 1.º ao 5.º ano) e ampliação das aulas de Inglês para crianças menores. “Entendemos que elas precisam de um tempo em casa e com a família. Mas precisamos olhar também as novas demandas familiares, com mães e pais trabalhando, filhos únicos sem contato com vizinhos ou primos”, diz a orientadora Karine Ramos.
A empresária Luana Silva, de 33 anos, matriculou os filhos Leonardo e Vitor Miguel, de 4 e 6 anos, este ano no colégio, mesmo sem a oferta do período integral. “Eu me desdobrei o ano inteiro para cuidar deles pela manhã e trabalhar. Procurei escolas bilíngues e com período ampliado e, apesar de atenderem melhor meus anseios, não tinham os princípios de educação que procurávamos para as crianças”, conta a mãe, que ficou aliviada ao saber que em 2019 o Santa Maria vai oferecer mais atividades para os alunos.
Professores
A ampliação da carga horária e a oferta de período integral também tornam os colégios mais atrativos para os professores, que poderão dar mais aulas – e consequentemente ter um salário melhor – em uma única unidade. Muitas escolas tradicionais perderam docentes este ano para os novos colégios, já que eles oferecem remunerações que podem chegar a até R$ 20 mil – 40% acima da média.
O centenário Colégio São Luís, na região central, anunciou este ano novo currículo internacional, ensino em tempo integral e uma sede maior, na região do Ibirapuera. A escola pretende também aumentar dos atuais 40% para 80% a proporção de docentes com dedicação exclusiva em 2020.
A diretora-geral, Sônia Magalhães, diz que está aumentando progressivamente as horas semanais de formação remunerada, para motivar e qualificar os profissionais para o novo projeto. A formação é focada em inovação e novas metodologias de ensino. “Sempre fomos bem posicionados do ponto de vista de remuneração, mas, além de bons salários, os professores também querem um propósito, pertencer ao projeto.”
Propostas, valores e mais Inglês
“Uma escola com ensino forte e valores tradicionais” era o que buscava a médica Andréia Fogaça, de 45 anos, para sua filha há seis anos, quando se mudaram do Rio para São Paulo. Encontrou essas características no Colégio Dante Alighieri, na região central paulistana, mas há alguns anos começou a questionar se a menina recebia uma boa base de Inglês. “Pesquisei escolas bilíngues, mas sentia uma limitação no ensino e na proposta. A alternativa foi compensar com aula extracurricular.”
A preocupação de Andréia e de outros pais fez com que o colégio firmasse uma parceria para oferecer o Middle School – um programa que fornece novas disciplinas, todas em Inglês, no contraturno, para complementar o currículo brasileiro e igualá-lo ao americano.
Antes, o colégio só oferecia o High School (do 9.º ano ao 2.º do ensino médio), mas pela demanda dos pais adiantou em 2018 a oferta a partir do 7.º ano. Em 2020, quer começar a ofertar no 6.º. “Sem dúvida os pais se preocupam porque entendem que, quanto antes o jovem tiver contato com o idioma, mais fácil vai aprender”, diz a coordenadora Rossella Beer.
Para ela, o Dante não compete com as novas escolas – não só pela diferença do preço das mensalidades, mas também pela proposta e valores. “Os pais sabem que estamos preparando os filhos para o mundo, com os princípios esperados pelas famílias”, diz Rossella.
Diversidade
Andy Williams, diretor pedagógico global da Avenues considera saudável que a chegada de novas unidades estimulem a reflexão sobre o ensino. “Não posso dizer que nossa metodologia é a melhor para todas as crianças. Não acho que as escolas de São Paulo precisam mudar e oferecer o mesmo que oferecemos, porque já atendem muito bem às necessidades e aos anseios dos pais. A diversidade no ensino é muito importante.”
As aulas na Avenues começaram em agosto com 733 alunos, mas a expectativa é chegar a 2,1 mil nos próximos anos. Cem novas matrículas são esperadas para janeiro. A escola diz receber semanalmente 30 novas famílias interessadas.
Thamila Zaher, diretora executiva do grupo SEB, dono do Colégio Concept, que iniciou as atividades em São Paulo este ano, também avalia como positivo o movimento das escolas de repensar o ensino e buscar inspirações. “Nossa escola também nasceu da inspiração de outros lugares. Visitamos muitos colégios, muitos países.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.