Suas ideias soam como autoajuda, mas o filósofo suíço Alain de Botton não se importa: mais que uma definição, o importante é ajudar o leitor, de forma consistente, a aperfeiçoar a comunicação de desejos e aprimorar a negociação dos conflitos do amor. Botton estará em São Paulo na quarta-feira, 21, quando fará uma palestra única intitulada Sobre o Amor, no Teatro Tuca.
Botton é fundador da School of Life, escola da vida, destinada a lidar com questões sobre satisfação pessoal e como melhorar o cotidiano. O espaço surgiu em 2008, em Londres, e, devido ao sucesso, o conteúdo foi transformado em uma série de livros, coordenados por ele mesmo. No Brasil, o espaço comemora agora cinco anos. Na conversa com o público, o suíço vai falar também sobre o recém-lançado Grandes Pensadores (Sextante), coletânea de ideias encontradas na obra de filósofos, artistas e romancistas, enfim, o cânone da School of Life. Por e-mail, Botton respondeu as seguintes questões.
Parece que as pessoas hoje estão confusas sobre filosofia.
A filosofia começou na Grécia Antiga como o anseio pela sabedoria – discutiu como viver e morrer bem e lidar com os problemas de outras pessoas e da sociedade. É o que a palavra filosofia significa: vem de ‘philo’ que significa ‘amor’ e ‘sophia’ que significa ‘sabedoria’. Tratava de assuntos que hoje soariam como títulos de autoajuda: como manter a calma, como buscar a felicidade, quando é certo mentir para alguém? Nos tempos modernos, filosofia tornou-se um estudo acadêmico. Tal como acontece com a arte pela arte, a ideia era que você deveria estudar filosofia por ela mesma. Você poderia passar anos estudando, por exemplo, a visão de Lacan sobre Heidegger – mas o objetivo não era ajudar alguém com os problemas reais da vida. A filosofia afastou-se de suas grandes tarefas práticas porque o prestígio intelectual ficou preso à proposta de ser muito complicado, muito erudito e bastante abstrato. É uma espécie de tragédia porque, em nossas vidas reais, essas não são as qualidades das quais necessitamos com urgência.
Como podemos examinar nossa própria visão de amor para sermos mais felizes?
Herdamos uma visão romântica do amor: duas pessoas que são almas gêmeas, que sempre querem ter relações sexuais (mas apenas uma com a outra), que são completamente honestas e apaixonadamente devotadas à felicidade uma da outra. De acordo com essa ideia, amor significa encontrar a única pessoa que é a perfeitamente certa para nós. É uma ideia doce, mas incrivelmente rara na realidade. É um guia desastroso para o que deveríamos estar buscando, porque nunca vamos encontrá-lo.
E o que fazer?
Uma ideia mais construtiva vê o amor como algo que desenvolvemos com outra pessoa que não é (e não pode ser) perfeitamente adequada para nós. Não é nossa alma gêmea, mas podemos aprender a nos comunicar melhor e a ouvir com mais atenção. São pessoas que serão irritantes e decepcionantes às vezes – mas podemos aprender a colocar isso em perspectiva: um relacionamento pode ser bom no geral, embora seja imperfeito em alguns aspectos. Muita infelicidade vem de expectativas elevadas que são impraticáveis. Se pensarmos que o amor será mágico, logo ficaremos muito desapontados. Se pensarmos que o amor é uma habilidade complicada, nossas expectativas serão mais precisas e teremos uma chance muito maior de podermos desfrutar de um relacionamento razoavelmente bom.
Você disse que o amor é uma habilidade a ser aprendida e não apenas uma emoção. Como você vê isso em países tropicais, como o Brasil, onde a paixão muitas vezes ultrapassa a razão?
Culturas geralmente enfatizam – para o excesso – certas ideias. A paixão é um ingrediente maravilhoso na vida, mas, por si própria, a paixão é um obstáculo para a nossa felicidade. Paixões são incrivelmente mutáveis – o que é inútil se queremos que as coisas durem. As paixões muitas vezes têm raízes profundas em nosso passado, das quais não temos consciência: podemos ser atraídos por pessoas que são pouco gentis conosco, porque isso repete um padrão infeliz na infância – quando amávamos um pai que estava muito ocupado ou que não estava muito interessado em nós. A sociedade nos dá apenas parte do que precisamos. Se você estivesse na Suíça, por exemplo, talvez precisasse de um pouco mais de paixão, ou se estivesse na Inglaterra, talvez precisasse de um antídoto para o constrangimento; trata-se realmente de reconhecer onde há uma falta de equilíbrio em nossa cultura.
Como essas ideias se conectam com a “época de crise” que você vê na cultura?
As sociedades têm imensos problemas e é muito difícil repará-los. Mas um fator fundamental que ainda não recebe a atenção necessária é o quão madura, ou emocionalmente educada, é uma sociedade coletivamente. Um padrão imaturo é alimentar grandes esperanças de melhoria rápida – o que é impossível de se concretizar; então, há uma reação de frustração. Um padrão mais maduro é esperar que as melhorias sejam lentas e difíceis e suspeitar das grandes promessas. Outra perspectiva política imatura é encontrar bodes expiatórios: grupos de pessoas que podem ser consideradas culpadas por coisas que dão errado. Uma sociedade mais madura pode admitir dolorosamente que as coisas podem ser ruins sem que isso seja culpa de qualquer grupo em particular. A maturidade emocional é crucial para o funcionamento das democracias, mas ainda não é tão prioritária nos objetivos como deveria ser. Há uma distância enorme para se viajar nessa direção e estamos modestamente apenas esboçando alguns movimentos iniciais na tentativa de ver como a educação emocional poderia ser desenvolvida de forma mais ampla.
GRANDES PENSADORES
Autor: The School of Life
Tradução: Beatriz Medina
Editora: Sextante (352 págs., R$ 69,90)
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.