O Teatro São Pedro encerra sua temporada lírica a partir deste sábado, 10, com a ópera Sonho de Uma Noite de Verão, de Benjamin Britten. Baseada na peça de mesmo nome de Shakespeare, a obra conta com direção cênica de Jorge Takla e direção musical de Claudio Cruz – e é mais um capítulo na tentativa do São Pedro de buscar maior diversidade de repertório para se estabelecer como referência no cenário.
Ao longo do ano, o teatro apresentou títulos menos conhecidos – ou pouco apresentados no Brasil – como Alcina, de Händel, e Katia Kabanova, de Janácek. A temporada 2019 ainda não foi anunciada, mas ao menos o ciclo dedicado ao compositor checo deve continuar, agora com O Caso Makropoulos, mais uma vez pelas mãos do diretor musical Ira Levin e do diretor cênico André Heller-Lopes.
Mas, antes, o Britten. O compositor britânico foi uma figura rara no panorama do século 20: um autor que se dedicou à ópera de maneira sistemática, escrevendo dezesseis títulos e fazendo do gênero pilar da sua criação. Entre suas obras, destacam-se Peter Grimes e Morte em Veneza, sempre com a escolha de personagens à margem como protagonistas a partir das histórias originais em que as óperas foram baseadas.
Sonho de Uma Noite de Verão, no entanto, segue de maneira muito próxima o original de Shakespeare. “Esta obra do Britten é mais do que uma adaptação da peça de Shakespeare. Ele valoriza o original, tornando-a mais enxuta, indo de cinco para três atos, mas sem perder nada da narrativa. Não há praticamente nenhuma palavra que não seja de Shakespeare. E ela sublinha musicalmente todas as sutilezas que poderiam escapar à nossa percepção emocional ou intelectual do texto original”, diz o diretor Jorge Takla, que volta ao São Pedro após o sucesso de Don Quixote, de Massenet, apresentada ao longo da temporada 2016 do teatro.
O texto da peça foi adaptado pelo próprio compositor, ao lado de seu companheiro, o tenor Peter Pears. Nela, Shakespeare narra encontros e desencontros amorosos durante o período de uma noite, com a participação importante da seiva de uma planta que, esfregada nos olhos durante o sono, faz com que a pessoa se apaixone pela primeira pessoa que vir ao acordar. Três “categorias” de personagens passam pela história: os seres da floresta (fadas, elfos e faunos), os casais de namorados e os rústicos, personagens mais “reais e simplórios”, nas palavras de Takla.
“Existem na partitura três atmoferas bem nítidas: o universo dos seres da floresta recebe uma linha quase barroca na sua construção”, explica o diretor. “Já os casais de namorados ganham música de caráter romântico. E os rústicos ficam com um estilo marcado pelo recitativo, cômico quase”, completa.
Para a mezzo-soprano Kismara Pessati, o grande desafio é internalizar o que ela chama de “maravilhosos efeitos musicais”, de forma que “tudo pareça natural”. Ela interpreta o papel de Oberon, rei das fadas. “É um personagem complexo, que carrega em si a ambiguidade do mágico e do humano”, ela diz. “Ele faz a ponte entre o mundo dos humanos e o das fadas. Assim, tem a capacidade de se tornar invisível e também de se disfarçar como ser humano. Ele tem momentos de egoísmo, raiva e desejo de vingança, mas também é capaz de se arrepender e de lutar para que o amor vença.”
Takla recorre a Shakespeare e Jorge Luis Borges para explicar o norte que guia sua concepção para Sonho de Uma Noite de Verão, que tem cenários de Nicolás Boni, iluminação de Caetano Vilela, figurinos de Fabio Namatame e coreografia de Anselmo Zolla.
“Antes de mais nada, o que me interessa é o contraste entre o mundo real e o mundo imaginário, ou dos sonhos. Borges dizia que “lo real es lo imaginado” (o real é o imaginado). E Shakespeare: “when most I wink, the do mine eyes best see” (quando mais fecho os olhos, melhor eles veem). Eu, pessoalmente, não sei se estamos no mundo real ou se o mundo dos sonhos seria a realidade. Não sabemos nada na verdade. Só sabemos que existem estes dois mundos sim e que a passagem de um para outro é mágica. Esta ambiguidade me fascina e é a base de minha construção cênica”, afirma o diretor.
Além da presença de Kismara Pessatti, brasileira radicada na Europa, o elenco é composto por um time importante de solistas brasileiros, que inclui Rosana Lamosa (Titania), Manuela Freua (Helena), Pedro Ometto (Teseu), Juliana Taino (Hippolyta), Luciana Bueno (Hermina), Johnny França (Demetrius), Daniel Umbelino (Lysander), Homero Velho (Bottom), Saulo Javan (Quince), Anderson Barbosa (Snug), Luiz Guimarães (Flute) e Rodrigo Lopez (Puck), entre outros.
SONHO DE UMA NOITE DE VERÃO
Teatro São Pedro. Rua Barra Funda, 161, tel. 3661-6600. Hoje, 4ª e 6ª, 20h; 2ª, 14h; dia 18, 17h. R$ 30/ R$ 80. Até 18/11
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.