Aluno do ensino público durante toda a vida, Erick Henrique, de 25 anos, é um dos produtos da inclusão socioeconômica fomentada pela prova. Por ter pai militar, ingressou na Fundação Osório, da rede federal, aos 7 anos, depois de ser alfabetizado em uma instituição filantrópica.
Nascido e criado no Morro da Providência e sem condições financeiras ideais, o hoje empreendedor superou as dificuldades para ser aprovado na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), onde cursa Administração.
“Na rede estadual, percebi que a base que tive na Fundação Osório foi ótima. Questionei um pouco meu ensino médio. Queria fazer um curso, mas é muito caro e não tinha condições, mesmo trabalhando (comecei aos 16). Estudei em casa, sem muita motivação ou pré-vestibular, e no fim passei no curso que queria em uma faculdade pública”, disse.
As diferenças não residiam apenas no conteúdo. Filho mais velho dos três de uma dona de casa que só ingressou no ensino superior depois dele, relembra momentos em que a estrutura de sua escola, o Instituto Superior de Educação do Rio de Janeiro, da rede estadual, se mostrava defasada em relação ao ensino privado.
“Mesmo sendo uma escola de referência entre as públicas, não havia tecnologia de ponta e às vezes faltava professor. Ainda sofri com greves porque o governo não valoriza a educação. Faltava modernização porque o colégio não recebia investimentos compatíveis com a estrutura que precisava manter”, frisou.
Apoio
Juliane Godas, de 21 anos, tem uma história diametralmente oposta. A estudante de Medicina da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UniRio), que teve toda sua formação em escolas particulares, sabe das benesses que uma boa condição financeira traz. “Tenho total noção que faz muita diferença. É muito privilégio. Eu já sabia, mas vi na prática aqui na UniRio. Mesmo sem ter muito, eu estou muito à frente da maioria. Tive a sorte de ter condições financeiras de poder tentar três vezes”, declarou.
Nascida em Peruíbe, Juliane teve como principais dificuldades uma mudança de cidade e a adaptação a um ensino um pouco mais forte. Ela teve condições de ficar três anos em um cursinho e se esforçar para alcançar sua tão sonhada aprovação no curso de Medicina.
“Meus pais também pagaram aulas particulares no último ano, foi bem caro, ficou apertado, mas foi importante. Eu tive uma família com condições e estrutura para financiar minha educação. Pouquíssimas pessoas têm essa chance”, destacou ela.
Apesar de ter vivido em uma realidade diferente, ela defende a política de cotas. “Só reduz a diferença, não iguala. Ainda há um abismo”, opinou.
Visão dos dois lados
Já Pedro Diniz, também de 21, viveu os dois lados da moeda. De mau aluno no ensino particular até a evasão escolar, o filho de um administrador rural e uma dona de casa só pegou gosto pelo estudo no pré-vestibular. “Fui reprovado por duas vezes em Jacareí. Primeiro foi em escola particular. Não gostava de estudar. Na segunda vez, passei em uma prova de reclassificação do Estado, mas arrumei um emprego em São Paulo e larguei os estudos”, contou.
Após um ano sem estudar, o jovem, que se mudou duas vezes de cidade, resolveu voltar às salas de aula. Como bolsista integral do Cursinho da Poli, prestará vestibular pela segunda vez, e tentará ingressar no curso de Agronomia. “Paguei um supletivo com meu salário. Depois entrei em um pré-vestibular. Dividia as mensalidades com meu pai. No primeiro ano, não tive sucesso. Agora vou conseguir. Tenho toda a estrutura necessária.”
Um estudo feito pelo cientista de dados e mestre em Economia do Setor Público pela Universidade de Brasília (UnB) Leonardo Sales, a pedido do jornal O Estado de S. Paulo, mostra que fatores socioeconômicos estão correlacionados a até 85% da nota do Enem. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.