Uma roupa simples, atemporal, que não tem estação, não tem gênero e, principalmente, não tem ocasião tomou conta das passarelas na quarta-feira, 24, o quarto dia de desfiles da São Paulo Fashion Week. Está fora de moda pensar em um armário compartimentado com peças próprias para ir à festa, ao clube, ao trabalho. Isso não é sustentável. E se não é sustentável, não está na moda. O novo luxo mora na naturalidade. Mora em modelagens funcionais e confortáveis, portanto, amplas. Em peças pintadas à mão e em materiais nobres de fibras como o linho, a seda e o algodão. “Sair montado demais hoje é como se você carregasse uma legenda: estou desinformada. O legal agora é parecer que não fez esforço para se vestir”, diz a consultora de moda Bia Paes de Barros.
Nessa linha, é difícil pensar em uma roupa que fique tão chique usada com tênis quanto a de Gloria Coelho. Ainda mais quando a coleção é baseada em tons neutros, com uma cartela enxuta de branco, preto, craft, verde militar e gelo, como esta última que a estilista apresentou no teatro da Faap. Investindo em casacos esportivos, com golas poderosas e tecidos tecnológicos, Gloria explorou o universo dos trench-coats, das parkas e dos pelerines.
Sua inspiração vem do futuro, da estética de Blade Runner, da arquitetura de Copenhagen, dos círculos e efeitos tridimensionais da obra da artista Yayoi Kusama. O frescor está no jogo de formas rígidas e fluidas de suas modelagens combinadas de maneira equilibrada. “As saias longas com fendas abertas usadas com casacos estruturados são sexy e modernas, equação nem sempre fácil de alcançar”, diz Bia. Para completar, a maior parte dos looks veio com tênis de solado baixo. Foi mesmo um encontro feliz entre a modernidade, a feminilidade e a elegância.
Sintonizada com esse novo minimalismo, a marca Beira partiu de uma única tonalidade de bege para fazer um desfile que chamou a atenção pela limpeza estética que valorizava a construção das peças. Todos os vestidos, batas, saionas e calças soltas passaram por um processo de descoloração, que retira o tingimento anterior revelando nuances únicas. “Por trás de cada coleção está a funcionalidade”, diz a estilista Lívia Cunha Campos. “Minha linguagem surge da necessidade de fazer uma cava, uma manga, uma gola. Quanto mais você se aproxima desse processo, mais você o valoriza. E o consumo consciente surge, justamente, dessa valorização.”
Um ponto fora da curva, Lino Villaventura mostrou uma moda luxuosa, rica em um artesanato típico dos ateliês de couture. Suas peças, todas únicas e algumas já vendidas antes mesmo de serem desfiladas, são espécies de obras-primas de um mestre da costura.
Celebrando 40 anos de sua marca, Lino mostra vestidos que trazem uma vertiginosa mistura de bordados de miçangas, cascatas de pétalas, plumas de pavão branco, nervuras, patchworks. “Eu vou fazendo, vou criando, vou inventando”, assume o estilista, que não segue tendências.
Projeto Estufa
Três jovens estilistas se apresentaram nesta quarta. Pernambucana radicada no Rio, Helena Pontes foca numa alfaiataria feminina com interessantes geometrias, construída com uma paleta de cores terrosas em materiais naturais, como algodão.
Na sequência, veio a marca Ão, da figurinista Marina Dalgalarrondo. Rompendo convenções, ela investe numa coleção de roupas em algodão com elásticos que criam efeitos repuxados e volumes que provocam estranheza.
A Korshi 01 está entre um dos mais interessantes nomes do Estufa até aqui. O ponto de partida do estilista Pedro Korshi é um tipo de sustentabilidade focada no utilitarismo. Visando aproveitamento máximo de uma roupa, usa botões de pressão e aplicações de velcro em pontos estratégicos para desmembrar uma mesma peça em várias. Um trench-coat vira macacão e avental. Uma calça pode ter parte de suas pernas desconectada, transformando-se numa bermuda e numa bolsa. Mais mínimo impossível.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.