Completam-se 30 anos do lançamento de Asas do Desejo no Brasil, e foi na Mostra de 1988, a de número 12. Wim Wenders estava no ápice de sua carreira. Era o homem do momento, depois de emendar sua Palma de Ouro (Paris, Texas, em 1984) com um austero filme em homenagem ao mestre japonês Yasujiro Ozu, Tokyo-Ga. Quando surgiu, Asas do Desejo – a produção é de 1987 – provocou verdadeira comoção. Virou o maior sucesso de público do cineasta, seu filme mais cultuado. Nas três décadas decorridas desde então, a trajetória de Wenders tornou-se irregular, com mais desapontamentos do que boas surpresas. Até quando ousa, ele não surpreende mais. Já era?
A expectativa, com tantos projetos, é que consiga renovar-se. A Mostra, que o homenageia (re)apresentando Asas do Desejo neste domingo – às 14 h, no Itaú Frei Caneca 4 -, não deixa de também se arriscar. O filme manterá seu status de cult? Wenders foi, durante muitos anos, um autor de road movies. Fez filmes desconcertantes, propôs ousadas rupturas narrativas. E assim como reverenciou Ozu, celebrou seus mestres (norte)americanos. Nicholas Ray, Sam Fuller. Filmou a agonia do último, morrendo de câncer, em Nicks Movie. Reconstruiu, em Paris, Texas, a odisseia, mas o fez de forma invertida. O Ulisses moderno, com o filho, atravessa o deserto em busca da mulher, que partiu. Wenders deu foros de nobreza a um ator até então considerado de segunda, Harry Dee Stanton. E o que dizer da beleza de Nastassia Kinski?
Em Asas do Desejo, ele filmou Berlim pelo olhar dos anjos. Em alemão é Der Himmel Uber Berlin, O Céu sobre Berlim. Na cena inicial, os seres alados observam a cidade do alto de um monumento. Damiel e Cassiel, Bruno Ganz e Otto Sander. Como anjos, conseguem ouvir os pensamentos das pessoas. Percebem sua solidão, a dor, o desespero. Damiel tenta aplacar o desespero de um homem acidentado, Cassiel tenta evitar o suicídio de um jovem. Conversam, uma cena belíssima, sobre a história da criação do homem. Evocam o (ancestral) primeiro grito. Damiel, apaixonado pela trapezista/Solweig Dommartin, resolve se tornar humano. Renuncia à eternidade. Torna-se vulnerável. Conhece a dor, verte sangue. O amor é maior que a eternidade? Wenders voltou ao tema dos anjos em Tão Longe, tão Perto, de 1993, mas, naquela vez, a magia já se havia dissipado.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.