O produtor e músico norte-americano Angelo “Scrote” Bundini lembra de ouvir David Bowie pela primeira vez em canções como Golden Years e Fame, vindas do álbum Young Americans, uma fase musical do camaleão na qual seu som era descrito como “soul de plástico” – mas de forma elogiosa, já que a música Fame, por exemplo, chegou ao topo das mais tocadas dos Estados Unidos na época. Bundini, contudo, achou “estranho demais”. Hoje, aos 55 anos, ele ri da lembrança. É ele quem comanda a festa que tem rodado sobre os palcos do planeta desde 2016, após a morte de Bowie, aos 69 anos.
Iniciado dois anos atrás, portanto, o show Celebrating David Bowie, criado para ser algo único, “coisa de uma noite e só”, passou pela América do Norte, Europa, Oceania e Ásia em turnês cujo elenco de músicos (muitos deles com gravações e turnês ao lado de Bowie no currículo) não se manteve fixo: a ideia, aliás, era oposta a isso: que Bowie, onde quer que estivesse, fosse a estrela dessa celebração. E, dessa forma, a apresentação chega ao Brasil, com Bundini no comando, para um show único em São Paulo, no Auditório Simón Bolívar, do Memorial da América Latina, na Barra Funda, a partir das 21h.
Por questões geográficas (e pelo ineditismo do conceito do show na época) as apresentações que rodaram por Estados Unidos e Londres, anos atrás, levaram um elenco mais estrelado aos palcos. Participaram das apresentações nomes que iam dos atores Gary Oldman (ator e amigo próximo de Bowie) e Ewan McGregor, a vocalistas como Sting (The Police), Simon Le Bon (Duran Duran) e Corey Taylor (Slipknot). A banda também incluía músicos que frequentavam estúdios e os palcos com o próprio Bowie, convocados por Bundini e entregava praticamente três horas de performance, percorrendo os momentos mais importantes da carreira do homenageado.
Nesta vinda para a América Latina, quem capitaneia, em importância, o time que irá celebrar a obra de Bowie é Adrian Belew, guitarrista descoberto pelo inglês quando fazia turnê com o experimental Frank Zappa. Bowie convocou Belew para gravar com ele nos discos Stage (um ao vivo de 1978) e Lodger (1979) – este, a terceira parte da “trilogia de Berlim” de Bowie, iniciada dois anos antes, e fundamental para estabelecer o artista como um dos mais brilhantes nomes do pop a passarem pelo planeta.
Belew (cujo currículo também inclui tocar com bandas como King Crimson, Talking Heads e Nine Inch Nails) também pode ser reconhecido por quem esteve na primeira passagem de David Bowie por palcos brasileiros, no ano de 1990, durante a turnê Sound + Vision. Quando foi convidado por Bowie, Belew estava prestes a lançar mais um álbum solo, chamado Young Lions, e não se interessou em sair em turnê. Para convencê-lo, Bowie deu a ele uma música para o álbum, gravada com o nome de Pretty Pink Rose, e com a promessa de que, no palco, eles cantariam a canção juntos. E foi o que aconteceu nos dois shows no estádio Palestra Itália (em São Paulo) e na Praça Apoteose (no Rio de Janeiro).
Acompanham Belew e Bundini o cantor Angelo Moore (vocalista da banda Fishbone), o guitarrista australiano Paul Dempsey (da banda Something for Kate), o saxofonista Ron Dziubla, o baixista Creg McFarland (que substitui Anthony ‘House’ Chaba, quem vinha com o grupo em turnê, mas acabou deixando a vinda para a América Latina por causa de uma “emergência”, explicou Bundini) e o baterista Michael Urbano.
No Celebrating David Bowie, artistas locais são chamados para participações especiais. E, em São Paulo, o convocado foi o ator e músico André Frateschi, que leva a obra de David Bowie para os palcos daqui há pelo menos 12 anos, com o projeto chamado Heroes. Frateschi, aliás, é especialista em “interpretar” artistas icônicos nos palcos, já que também participa das mais recentes turnês da Legião Urbana.
Quase dois anos
David Bowie morreu em 10 de janeiro de 2016, dois dias depois de completar 69 anos e lançar Blackstar, seu álbum derradeiro. Deixou um legado musical incomparável e, por sua vez, poucas sobras de estúdio para possíveis lançamentos. De tal modo que, apesar de Blackstar ter liderado os rankings de vendas de discos de países como Estados Unidos e Reino Unido, pouco chegou às prateleiras (e plataformas de streaming), há pouco de inédito de Bowie por vir.
O EP No Plan, lançado um ano depois de Blackstar, com sobras de estúdio, foi a chegada mais relevante desde então, já que o grosso do restante do material de David Bowie são álbuns com registros ao vivo – como Live Nassau Coliseum ’76, Cracked Actor (Live Los Angeles ’74) e Welcome to the Blackout (Live London ’78) – e uma deliciosa versão demo de Lets Dance. Há uma semana foi lançada a coletânea Loving the Alien, centrada na produção de Bowie nos anos 1980, e, em novembro, chegará o registro da performance do inglês no festival Glastonbury de 2000.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.