O Vaticano e a China assinaram neste sábado, 22, um “acordo provisório” sobre a nomeação de bispos, um avanço no assunto que prejudicou por décadas as relações diplomáticas entre os dois e provocou uma divisão entre os católicos chineses.
O documento resolve um dos principais pontos de discórdia entre Pequim e a Santa Sé nos últimos anos, com o Vaticano concordando em aceitar sete bispos que haviam sido nomeados pela China sem o consentimento do papa Francisco.
O avanço surge quase 70 anos depois que a Santa Sé e Pequim romperam relações diplomáticas. A insistência de longa data da China de que deveria nomear bispos conflitava com a autoridade papal.
O Vaticano disse que agora todos os bispos na China estão em comunhão com Roma, mesmo que a comunidade católica no país ainda esteja dividida entre os católicos que pertencem à Igreja oficial da China e os que são da Igreja que permanece leal ao pontífice.
“O papa Francisco espera que, com essas decisões, um novo processo possa começar e permitir que as feridas do passado sejam superadas, levando à completa comunhão de todos os católicos chineses”, declarou o Vaticano em um comunicado.
Alguns católicos chineses se opuseram ao acordo, principalmente o cardeal de Hong Kong Joseph Zen, que havia chamado anteriormente a medida de venda daqueles que se recusavam a se unir à Associação Estatal Patriota de Católicos Chineses e pagavam o preço por permanecerem leais a Roma durante anos de perseguição.
Zen não respondeu aos pedidos por comentários sobre o assunto, mas em seu blog criticou a falta de detalhes do documento, incluindo a não menção do status de diversos bispos já nomeados pelo papa.
“Qual é a mensagem que esse comunicado transmite aos fiéis na China? ‘Acreditem em nós! Aceitem esse acordo!'”, escreveu ele, acrescentando que o texto é equivalente ao governo chinês dizer aos católicos “nos obedeçam, estamos de acordo com o seu papa”.
O porta-voz do Vaticano, Greg Burke, indicou que o acordo servirá como um rascunho para a nomeação futura de bispos, que lideram os fiéis em suas dioceses. Ele disse a jornalistas que o objetivo “não é político, mas pastoral, permitindo que os fiéis tenham bispos que estejam em comunhão com Roma e, ao mesmo tempo, sejam reconhecidos pelas autoridades chinesas”.
O número 2 do Vaticano indicou que o papa e as autoridades chinesas aprovariam conjuntamente as novas nomeações de bispos. “O que é necessário agora é unidade, e um novo impulso: ter bons pastores, reconhecidos pelo Sucessor de Pedro (papa Francisco) e pelas autoridades civis legítimas”, afirmou o cardeal Pietro Parolin.
Um oficial do Vaticano disse mais cedo neste ano que o acordo permite que o papa vete efetivamente futuras nomeações de bispos por Pequim. O funcionário, que pediu anonimato em razão das negociações diplomáticas envolvidas, descreveu o texto como o melhor arranjo que a Santa Sé poderia alcançar agora.
A natureza provisória do acordo deixou aberta a possibilidade de mudanças. O Vaticano descreveu o documento como “fruto de uma aproximação gradual e recíproca”, resultado de um “longo processo de negociação cuidadosa”.
Diplomacia e liberdade religiosa
Enquanto o acordo pode ajudar a pavimentar o caminho para retomar as relações diplomáticas entre o Vaticano e a China, e para uma possível viagem de Francisco ao país, também deve provocar a ira dos católicos que defendem vigorosamente que a Santa Sé mantenha um posicionamento linha dura no que diz respeito aos 12 milhões de fiéis chineses.
O acordo foi assinado em Pequim durante um encontro entre o vice-ministro das Relações Exteriores da China, Wang Chao, e o subsecretário do Vaticano para assuntos de Estado, Monsenhor Antoine Camilleri.
Em Pequim, Chao disse que a “China e o Vaticano continuarão a manter diálogo e avançar com o processo para melhorar as relações entre os dois lados”. Ainda assim, mesmo Pequim demonstrando o desejo de melhores relações com a Santa Sé, o documento foi assinado tendo como pano de fundo uma repressão chinesa às religiões.
Sob a presidência de Xi Jinping, o líder mais poderoso da China desde Mao Tsé-tung, os fiéis viram sua liberdade religiosa encolher. Especialistas e ativistas afirmam que conforme Xi consolida seu poder, promove a mais sistemática supressão do Cristianismo desde que a constituição chinesa permitiu a liberdade religiosa em 1982. O presidente tenta implementar em todas as religiões do país “características chinesas”, como lealdade ao Partido Comunista.